Libertar o País das amarras
No virar do ano, o PCP voltou a insurgir-se contra o pacto de agressão, vendo nele «um resgate da banca e um sequestro do País e da democracia». Reiterou por isso que só a derrota deste Governo e desta política abre caminho à resolução dos actuais problemas e à construção de um futuro melhor.
Não pode ser o povo a pagar os lucros da banca nem os crimes do BPN
«A política de diminuição dos salários, de destruição do aparelho produtivo e de reconstituição do poder dos monopólios – juntamente com o desmantelamento dos serviços públicos e as privatizações a eito – conduz o País para uma rota de afundamento nacional e coloca-o numa posição cada vez mais desvantajosa para superar as deficiências estruturais da nossa economia», afirmou o deputado comunista Miguel Tiago em declaração política no Parlamento.
Avaliando o que foi o ano e meio de política ditada pelo acordo assinado pelo PS, PSD e CDS-PP com a troika, considerou que desse período o que emana é o «aumento da dívida pública, o aumento da despesa com juros, o assalto aos rendimentos dos trabalhadores do sector público e privado» e às pensões e reformas.
Uma política que tem sido igualmente sinónimo de «jovens a abandonar a escola», «crianças a passar fome», «famílias no desemprego e na miséria», «idosos abandonados e sem meios», «portugueses obrigados a abandonar o País», enquanto, paralelamente, «um punhado de grupos económicos concentra cada vez mais riqueza, apoderando-se de cada vez mais lucros».
Factura insuportável
Foi para esta dupla face da realidade que Miguel Tiago chamou a atenção, realçando sobretudo essa diferença que existe entre aqueles que «continuam a amassar lucros crescentes» – como a banca, a EDP, a Galp e outros grupos económicos de todos os sectores –, enquanto os portugueses «pagam os juros do chamado “empréstimo da troika”».
Uma factura pesadíssima que está a ser paga com língua de palmo pelas classes trabalhadoras, seja, como foi dito, por via da supressão de direitos, do roubo dos salários, da fragilização das relações laborais, do aumento dos horários ou da generalização da precariedade, seja pela contracção da actividade económica e do emprego ou pelas privatizações.
Daí que o parlamentar do PCP tenha concluído que «cada dia que passa sob a política de direita é um dia de retrocesso civilizacional, de aproximação a um passado negro que Portugal já viveu e não quer tornar a viver».
E por isso recusou que sejam os trabalhadores e o povo a pagar com a sua miséria e com as suas vidas «os lucros dos bancos, os crimes do BPN, do BPP, as parcerias público-privadas, as privatizações e os caprichos dos milionários».
«Os portugueses não “viveram acima das suas possibilidades”, o que ganharam foi “salários muito abaixo das suas necessidades”», sustentou Miguel Tiago, frisando que «se a banca facilitou o crédito acima das suas possibilidades, a banca que pague os juros».
A alternativa
O deputado comunista reafirmou por fim a sua convicção de que é na Constituição que estão as «soluções» e é «em Abril» que está «o projecto de futuro para Portugal». E aos que endossam para entidades externas (União Europeia, BCE, por exemplo) a resolução dos nossos problemas, como em sua opinião faz o PS, lembrou ainda que «é em Portugal que se trava a batalha», «é aqui e agora que urge responder à ofensiva», «é aqui e agora que os portugueses de todos os sectores (…) lutam por um futuro em que austeridade e endividamento sejam combatidos com prosperidade e crescimento».
Roubos descarados
Atinge já quase os seis mil milhões de euros o montante gasto pelo Estado para «cobrir os crimes do BPN», uma quantia equivalente a 20 anos de propinas gratuitas. Este é apenas um dos muitos exemplos reveladoras de uma política que põe «todo o Estado ao serviço dos interesses privados que tomaram por dento o poder com base na mentira e na dissimulação». Como salientou Miguel Tiago, este é o resultado da política gizada pelo «pacto de agressão das troikas» que, para salvar a banca, tudo sequestra, o País, a democracia, o melhor do nosso património público (a RTP, a TAP, a REN, a ANA-Aeroportos, a Águas de Portugal, os Estaleiros de Viana, a Cimpor), a Escola Pública, o Serviço Nacional de Saúde, as Forças de Segurança e por aí fora.
O deputado do PCP fez ainda outras contas e concluiu que os 7500 milhões de euros pagos por ano em juros equivalem a 750 anos de apoio às Artes em Portugal, enquanto, por outro lado, os 1200 milhões de euros em benefícios fiscais concedidos aos grupos económicos e ao sector financeiro correspondem a 12 anos de manuais escolares gratuitos para todos.
Aberração
O deputado Miguel Tiago demonstrou ainda de forma clara na sua intervenção como a distribuição equitativa dos sacrifícios invocada pelo Governo não passa de pura treta, sem qualquer base ou fundamento. Prova-o desde logo o facto de a fatia do rendimento nacional correspondente aos salários ser inferior a 40%, enquanto que a dos rendimentos de capital (juros, rendas, lucros) ultrapassa os 60 por cento.
Esta injusta repartição é visível de «forma particularmente brutal», ainda na perspectiva do deputado do PCP, na previsão de aumento da carga fiscal para 2013, uma vez que esta incide em 93% sobre os salários e apenas em 7% sobre os rendimentos do capital (2810 milhões de IRS e 215 milhões de IRC).
Assim, em 2013, os impostos sobre o trabalho representarão 72,5% dos impostos directos recolhidos pelo Estado, sublinhou Miguel Tiago, que lembrou ainda que a receita fiscal de IRS aumenta 30,7% enquanto a de IRC se fica pelos 3,9%.
Disparidades a que reagiu com ironia, observando o quanto «aberrante» é a «ética social na austeridade» propalada pela direita.