Contrapartidas dos submarinos

Escândalo de bradar aos céus

O PCP insiste na necessidade absoluta de ouvir no Parlamento o ministro da Economia sobre o caso das contrapartidas relacionadas com a aquisição de submarinos aos alemães da Ferrostaal.

Este é um exemplo claro de gestão danosa do interesse público

Esta posição foi reiterada ao Avante! pelo deputado comunista António Filipe face ao que considera ser «um dos maiores escândalos financeiros dos últimos anos» e que é nem mais nem menos do que «o incumprimento impune das contrapartidas que são devidas à economia nacional pela aquisição de equipamentos militares».

Trata-se de um caso flagrante de «gestão danosa do interesse público, por parte do Governo», que «não pode passar em claro», reiterou ao nosso jornal o parlamentar comunista, sublinhando assim a importância desta presença na AR do ministro que tutela a pasta da Economia com vista a obter não só um esclarecimento cabal dos «contornos deste negócio» como a permitir que haja da sua parte uma assumpção plena de responsabilidades perante o País.

Arrumar assunto

Este é um assunto que há muito preocupa a bancada comunista e que inclusive justificou iniciativas suas de natureza diversa, a última das quais já na recta final do ano transacto sob a forma de declaração política proferida em plenário por António Filipe.

Lembrado foi nessa intervenção que o Estado havia sido lesado em 721 milhões de euros pela Ferrostaal, valor correspondente às contrapartidas que estão por cumprir, segundo apuramento da Comissão Permanente de Contrapartidas relativo a 2011 e tornado público em relatório de 30 de Março de 2012.

Nesse mesmo relatório são explicitadas «várias hipóteses em negociação» (designadamente um investimento da empresa Koch de Portugal, um projecto designado por MedSim na área da medicina, a criação de um Fundo de Investimento de Capital de Risco), recordou o deputado do PCP, assinalando que foi com surpresa que a dada altura tomou conhecimento pela imprensa de que o Ministério da Economia acordara em Outubro passado com o Fundo de Investimento Alemão MPC, que controla a Ferrostaal, «fechar o contencioso das contrapartidas não prestadas, através da recuperação de um hotel de luxo em Albufeira».

Ora sucede, observou António Filipe, que a recuperação dessa unidade hoteleira há muito estava prevista, tendo, inclusivamente, sido classificada pelo anterior governo como projecto de interesse nacional (PIN), o qual só não terá avançado por dificuldades de financiamento do referido Fundo de Investimento Alemão a que estava associado.

Ovo de Colombo

A recuperação do hotel Alfamar, que era do total interesse do Fundo MPC que passou a controlar a Ferrostaal e que lhe custará 150 milhões de euros – e aqui reside segundo António Filipe o «ovo de Colombo» encontrado pelos interlocutores do Estado português –, foi assim erigida de mero projecto privado de âmbito restrito à categoria de contrapartida pelos submarinos.

Mais grave ainda é que o Governo – qual «mãos largas» – tenha considerado que o valor dessa contrapartida seja de 600 milhões de euros, 150 milhões do investimento propriamente dito, mais 450 milhões dos negócios gerados pelo avanço do projecto, «cujo proveito será, obviamente, do grupo alemão», como bem frisou o parlamentar do PCP.

E quanto às contrapartidas, «não se fala mais nisso», ironizou António Filipe, realçando, por outro lado, que de tão magnânimo, tal gesto do Governo levou já a que a defesa dos arguidos no processo que corre na justiça portuguesa (ver caixa) viesse dizer que se o Estado se dá por satisfeito com as contrapartidas assim acordadas, «não há qualquer razão para que se mantenha a acusação de burla e falsificação de documentos e que o processo deve ser arquivado».

Em suma, o Estado é lesado em 721 milhões de euros, por contrapartidas que não foram prestadas e que deveriam beneficiar a capacidade da indústria nacional, sendo o assunto dado por encerrado com o avançar de um projecto privado há muito parado de 150 milhões e que por alquimia com a cumplicidade do Governo passa a ter o valor de 600 milhões.

Negócio de milhões

O negócio da compra de dois submarinos aos alemães da empresa Man Ferrostaal, pela quantia de 1070 milhões de euros, remonta a 2003, era então primeiro-ministro Durão Barroso, ocupando Paulo Portas a pasta da Defesa.

Nos termos da engenharia financeira consagrada na Lei de Programação Militar, aprovada por PS, PSD e CDS-PP, o Estado pagou 185 milhões até 2011, pagará 410 milhões entre 2012 e 2017, e mais 407 milhões entre 2018 e 2023, só ficando os submarinos pagos em 2026.

Entretanto, conforme notou António Filipe, «os portugueses vêem os subsídios de férias e de Natal ir por água abaixo, porque, de acordo com o PSD e o CDS-PP, andaram a viver acima das suas possibilidades».

Águas turvas

O contrato assinado em 23 de Abril de 2004 entre o Estado e o German Submarine Consortium (GSC), para vigorar entre 2004 e 2012, determinava contrapartidas a gerir pela empresas Ferrostaal que ascendiam a 1210 milhões de euros. A sua concretização é um historial de incumprimento. Nos primeiros seis anos do contrato (entre 2004 e 2010), como lembrou António Filipe, 10 dos 39 projectos incluídos no programa não tinham registado qualquer movimento.

Mas outros factos pouco abonatórios para os seus protagonistas marcam ainda todo este processo. É que surgiram entretanto processos criminais por corrupção, na Justiça alemã, com arguidos já condenados, bem como na Justiça portuguesa, por burla qualificada e falsificação de documentos, em fase de julgamento.



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