Agricultura é essencial para a soberania

Defender a produção e os produtos nacionais

Gustavo Carneiro
– texto
Inês Seixas, Jorge Cabral e Jorge Caria
– fotos

Se há camada da população que empobreceu drasticamente nos últimos anos foi a dos agricultores. Jerónimo de Sousa testemunhou isso mesmo numa visita a uma exploração de arroz em Alcácer do Sal.

Desapareceram mais de 300 mil explorações agrícolas desde 1989

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Há 20 anos os produtores de arroz da Herdade da Comporta vendiam o quilo de arroz a 100 escudos (50 cêntimos); no ano passado, o preço médio que receberam foi de 30 cêntimos. Acrescentando a isto o brutal aumento, no mesmo período, dos factores de produção (combustíveis, electricidade ou adubos) poderá ter-se uma ideia, ainda que pálida, do grau de empobrecimento dos agricultores.

Foi isto mesmo que testemunhou um representante da Associação de Agricultores do Distrito de Setúbal (AADS) no encontro com Jerónimo de Sousa, realizado faz hoje uma semana na Junta de Freguesia do Carvalhal, em Grândola: só em 2011 o rendimento dos trabalhadores portugueses sofreu uma diminuição na ordem de 11 por cento. Longe de afectar apenas esta camada social, este problema põe em causa a própria soberania nacional, pois é precisamente no baixo rendimento da actividade agrícola e nas suas consequências que residem as causas fundas do brutal défice alimentar do País, que ronda já os quatro mil milhões de euros.

Graças às políticas nacionais e comunitárias, desapareceram entre 1989 e 2009 mais de 300 mil explorações agrícolas, «com especial relevo para as pequenas e médias, ao mesmo tempo que a dimensão das grandes explorações aumentou», acrescentou o membro da AADS. Da mesma forma, nos últimos 10 anos a superfície agrícola recuou mais de 450 mil hectares e, em 20 anos, a superfície irrigável perdeu 337 mil hectares (-38%) e a superfície regada é hoje inferior em 162 mil hectares (-26%).

Actualmente, há em Portugal cerca de um milhão e meio de hectares de terra abandonada e mais de 125 mil hectares de terreno agrícola por cultivar, denunciou ainda o membro da associação, que não esqueceu as desigualdades na atribuição dos subsídios: cinco por cento dos maiores agricultores arrecadam 90 por cento das ajudas e só em Alcácer do Sal «pouco mais de meia dúzia» de grandes agrários recebem mais de 70 por cento do Regime de Pagamento Único do concelho.

 

Especulação arruína produção

 

A actividade predadora das grandes cadeiras de hipermercados também tem, e de que maneira, a sua parte de responsabilidade na difícil situação dos agricultores. Tal como já o havia feito o representante da AADS, também Jerónimo de Sousa as acusou de manipularem preços na produção e no consumo e de promoverem importações desnecessárias. Com isto, prosseguiu, «esmagam, em baixa, a produção nacional e a pequena e média agro-indústria».

Os «saldos» de produtos e bens agro-alimentares que as maiores cadeias estão a fazer demonstram as margens de lucro especulativas que, em regra, os hipermercados têm. E revelam ainda que, em muitas ocasiões, estes praticam o dumping para arruinarem a concorrência, «a produção e a pequena e média indústria».

A própria Autoridade da Concorrência destacara, já em 2010, o «desequilíbrio negocial entre as duas partes [distribuidores e fornecedores], com preponderância para os primeiros». Resta, agora, que o Governo passe das palavras aos actos intervindo para pôr cobro a esta situação, salientou Jerónimo de Sousa.

Aos agricultores que transbordaram a sala da Junta de Freguesia do Carvalhal, o Secretário-geral do PCP exortou: «continuem a produzir e a lutar para defenderem e melhorarem o nível dos rendimentos das vossas explorações, para contribuírem para a produção nacional».

  

Reforma da PAC é para rejeitar!

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Num momento em que está em discussão a revisão da Política Agrícola Comum para o período compreendido entre 2013 e 2020, o Secretário-geral do PCP alertou para as «más perspectivas» quanto ao seu conteúdo. Para além da esperada redução do orçamento para a agricultura e mundo rural, está em cima da mesa nesta revisão o desmantelamento das quotas leiteiras e dos direitos de plantação da vinha o que, a consumar-se, seria desastroso para a economia e para o País, sublinhou o dirigente comunista.

Não há igualmente qualquer intenção de aproximar o nível das ajudas entre países e produções, denunciou Jerónimo de Sousa, realçando que os comunistas não aceitam que agricultores de outros países recebam três vezes mais por hectare do que os portugueses.

«Não se escude o Governo nas exigências da troika e da União Europeia», afirmou o Secretário-geral do PCP, pois «agora é tempo de o Governo português não aceitar mais uma reforma da PAC lesiva do interesse nacional e comprometedora da soberania alimentar de Portugal e dos portugueses». Esta, realçou, é uma «exigência patriótica» que o PCP faz ao Governo.

O dirigente comunista valorizou ainda a luta dos agricultores em defesa dos seus interesses e direitos e em defesa do próprio mundo rural, nomeadamente a manifestação promovida pela CNA no dia 4 de Maio, em Lisboa. Antes, já o representante da Associação dos Agricultores do Distrito de Setúbal tinha enumerado as principais reivindicações dos produtores: a melhoria os preços pagos à produção e dos rendimentos das explorações familiares; a redução do preço dos combustíveis, da electricidade, das rações, dos fertilizantes; mais investimento público agrícola e adopção de medidas para travar a desertificação; combate à especulação, à fraude e à manipulação com os preços à produção e ao consumidor; uma nova lei do arrendamento rural que respeite a Constituição da República; o pagamentoimediato das ajudas em falta relativas a 2010 e 2011.

 

Rendas, secadores… e o Grupo Espírito Santo

 

Os produtores de arroz da Herdade da Comporta têm problemas próprios, a acrescer aos que partilham com os restantes agricultores portugueses. A administração da Herdade, nas mãos do Grupo Espírito Santo, pretende vedar o acesso às praias (e a certas explorações agrícolas) e estabelecer contratos de arrendamento desfavoráveis para os agricultores. O Projecto de Interesse Nacional (o famigerado PIN) previsto para aquele espaço poderá provocar um aumento exponencial não apenas das próprias rendas como do IMI pago pelas populações.

Mas os agricultores não se deixam abater e, organizados na sua associação, lutam em defesa dos seus direitos: é o que têm feito na defesa de novos contratos de arrendamento rural, mais favoráveis, por um período de sete anos e não contratos de campanha como a empresa pretende (embora a associação os admita, se for essa a vontade dos agricultores). A AADS bate-se ainda por uma nova Lei do Arrendamento Rural, pois considera que a actual, que liberalizou as rendas, viola a Constituição.

Mas a grande batalha dos pequenos produtores de arroz desta região tem sido pela manutenção do usufruto dos centros de secagem de Alcácer do Sal e Águas de Moura. Há nove anos que os agricultores que não possuem secadores puderam passar a utilizar os equipamentos da ex-EPAC, geridos pela AADS, o que permitiu que os preços não fossem ainda mais baixos e garantiu aos produtores uma relativa independência face a intermediários e industriais.

Apesar de terem sido feitos avultados investimentos nesses equipamentos durante o período em que foram utilizados pelos pequenos produtores, o Governo decidiu no início deste ano vender em hasta pública o centro de secagem de Alcácer. Acredita-se que para o entregar à APARROZ, associação dos grandes produtores.

Entretanto, com a luta encabeçada pela Associação dos Agricultores do Distrito de Setúbal, o Governo suspendeu a venda – uma vitória, sem dúvida, mas que terá que ser confirmada. Como afirmou um dos agricultores durante a visita de Jerónimo de Sousa à exploração na localidade da Torre, «se nos tiram os secadores, ficamos nas mãos deles [dos grandes produtores], partem-nos o resto das pernas». Mais tarde, já na Junta de Freguesia do Carvalhal, o dirigente comunista realçaria a importância destes equipamentos para garantir uma produção local acima das seis mil toneladas anuais e preços à produção acima de 30 cêntimos.



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