PCP analisa dez anos de política de direita

Exigência de ruptura

A finalizar, no sábado, o seminário promovido pelo PCP sobre «dez anos de política de direita», Jerónimo de Sousa garantiu que há alternativas capazes de assegurar a construção de um Portugal «mais justo, mais solidário e mais desenvolvido».

A luta interrompeu políticas injustas e garantiu vitórias parciais

O PCP reuniu, num hotel da capital, especialistas em várias áreas para abordarem a evolução do País nos últimos dez anos e traçarem perspectivas de ruptura. Em análise estiveram temas como a evolução económica, o emprego e o desemprego, a integração europeia, a política cultural, os ataques à Constituição e a reconfiguração do Estado ao serviço do poder económico.
Na sua intervenção, o Secretário-geral do PCP considerou justa a ideia de que a primeira década deste século foi uma «década perdida para o nosso desenvolvimento económico e social». Uma ideia que, acrescentou, «qualquer abordagem séria e de rigor à realidade portuguesa não deixará de secundar».
Realçando não ser possível «desligar a mais recente evolução da nossa vida colectiva do que foram os últimos trinta e quatro anos de políticas de recuperação capitalista e restauração monopolista», Jerónimo de Sousa caracterizou a situação criada em resultado de tais opções e orientações políticas: a evolução negativa dos sectores produtivos; as «profundas alterações verificadas no sectores estratégicos da economia nacional com a sua privatização e o seu crescente domínio pelo grande capital»; a manutenção e agravamento dos principais défices estruturais; o desvalorizado perfil da especialização produtiva; a prolongada ofensiva que conduziu à fragilização e destruição de importantes direitos económicos e sociais dos trabalhadores.
Esta realidade, acrescentou o dirigente comunista, foi «moldada por uma progressiva influência do grande capital monopolista sobre o poder político, cada vez mais capturado e dependente dos seus interesses, em detrimento do interesse nacional». Isto tem-lhe permitido exercer um domínio «quase absoluto sobre a economia e os principais instrumentos de dominação ideológica, incluindo o sistema mediático altamente concentrado».

Exploração e luta

Reconhecendo que as debilidades e fragilidades do País não começaram no início da década, o Secretário-geral do PCP realçou que estas se acentuaram nessa altura com a «mudança qualitativa no enquadramento europeu» – a adesão à União Económica e Monetária e a «Estratégia de Lisboa».
Duas realidades que, explicou, «deram um impulso renovado ao processo de liberalização e privatização dos sectores básicos e serviços públicos, à desindustrialização, ao aprofundamento da financeirização da economia, ao desmantelamento da protecção social que a política de direita e as forças do bloco central político e de interesses vinham concretizando em Portugal». Já a adesão à moeda única constituiu um «novo factor» de redução da capacidade competitiva do País e, através do Pacto de Estabilidade e Crescimento, foram congeladas as políticas de crescimento e desenvolvimento.
Assim, e em nome da Estratégia de Lisboa e da competitividade, promoveu-se a «mais brutal ofensiva contra os direitos laborais e sociais dos trabalhadores», de que são exemplo o Código de Trabalho do governo PSD/PP e a sua revisão para pior, a cargo do PS. Consolidou-se, desta forma, o modelo de desenvolvimento assente nos baixos salários, baixas qualificações e no trabalho sem direitos.
Mas outra realidade marcou a década, salientou Jerónimo de Sousa: a luta de massas. Em algumas das maiores jornadas de luta de sempre – como foram as grandes manifestações da CGTP-IN, da Administração Pública, dos professores, dos enfermeiros, dos jovens trabalhadores e estudantes, das populações – interrompeu-se políticas e derrotou-se governos, para além da obtenção de «importantes vitórias parciais».

Há outros caminhos

A terminar a sua intervenção, o Secretário-geral do Partido destacou a existência de «outras soluções e outros caminhos» para a solução dos problemas do País. Soluções que importa reafirmar e valorizar, «num momento em que se avolumam as pressões para impor como única saída as mesmas e fracassadas políticas».
O País precisa de uma nova política, capaz de relançar o País na direcção do desenvolvimento económico e social, destacou Jerónimo de Sousa. Para tal, há que promover, com urgência, a ruptura com os eixos centrais da política de direita: privatizações, liberalizações e desregulamentações; desmembramento dos sectores estratégicos da economia; guerra à Constituição de Abril; favorecimento e domínio do capital monopolista e das multinacionais; submissão da soberania e do País aos interesses das grandes potências e do grande capital financeiro.
A isto terá de se contrapor uma política de ruptura, patriótica e de esquerda, «ao serviço do País», que tenha como objectivos centrais o pleno emprego; o crescimento económico; e a defesa e afirmação do aparelho produtivo nacional – porque Portugal, concluiu, «não está condenado à inevitabilidade de prosseguir as mesmas políticas e o mesmo caminho».

Eixos centrais da alternativa

A política de desenvolvimento económico que o PCP propõe exige a recuperação pelo Estado do comando político e democrático do processo de desenvolvimento, afirmou Jerónimo de Sousa no final do seminário de sábado. Esta será, mesmo, a «primeira grande linha de orientação visando a afirmação da soberania, na base de um sector empresarial do Estado com um papel produtivo nos sectores estratégicos». Trata-se, destacou o dirigente comunista, da «condição-chave para a manutenção em mãos nacionais de alavancas económicas decisivas para a promoção do desenvolvimento».
A valorização do trabalho e dos trabalhadores – através de uma «justa repartição da riqueza», com a valorização dos salários e do seu poder de compra e o aumento do salário mínimo nacional e da defesa do trabalho com direitos – é outro dos eixos essenciais de uma política alternativa.
Ao nível fiscal, sublinhou Jerónimo de Sousa, o objectivo terá de ser o «aliviar da carga sobre as classes laboriosas e pequenas empresas». Ao mesmo tempo que se deverá procurar alargar a base e o aumento da fiscalização tributárias, através da redução dos benefícios fiscais, nomeadamente ao sector financeiro, e da imposição fiscal sobre o património mobiliário e ganhos bolsistas.
A promoção e valorização dos serviços públicos; a defesa do meio ambiente e o ordenamento do território; um efectivo desenvolvimento regional; a adopção de uma «verdadeira reforma democrática» da Administração Pública; a instituição das regiões administrativas; o aprofundamento dos direitos, liberdades e garantias; uma Justiça independente, democrática e acessível; a garantia da subordinação do poder económico ao poder político; e a ruptura com a subordinação aos interesses da União Europeia e da NATO foram alguns dos restantes eixos enunciados pelo dirigente comunista.

A perder em tudo

A designação de «década perdida» para definir o período compreendido entre 2000 e 2010 foi confirmada nas várias intervenções proferidas no seminário promovido pelo PCP no sábado. Ao nível do emprego, por exemplo, a população empregada no terceiro trimestre de 2009 era inferior à existente no ano 2000, destacou o economista Eugénio Rosa. Para esta diminuição, o governo do PS, chefiado por José Sócrates, deu um grande contributo. Entre 2005 e 2009, foram destruídos mais de 72 mil postos de trabalho na Administração Pública.
Não só ao nível da quantidade se nota uma evolução negativa: entre 2004 e 2007, os trabalhadores com contratos sem termo diminuíram em 43 mil, a que se somaram, entre 2007 e 2009, mais 34 mil. Já o número de contratados a termo aumentou, entre 2004 e 2007, 139 mil, enquanto que os chamados «independentes» atingiam os 922 mil. A situação só se alterou a partir de 2008, mas pelas más razões – estes trabalhadores foram os primeiros a ser despedidos.
Por seu turno, Carlos Carvalhas, do Comité Central, avaliou a evolução da distribuição do rendimento nacional. Se em 1953, essa era de 53 por cento para o capital e de 45 por cento para o trabalho, entre 1974 e 1976, passava para 59,5 por cento para o trabalho e 40,5 para o capital. Valores que se apresentavam invertidos em 2005, aquando da divulgação dos últimos dados disponíveis.
A deputada no Parlamento Europeu, Ilda Figueiredo, alertou para o conteúdo da «Estratégia Europa 2020», em preparação. Aí vem, embalada pela entrada em vigor do Tratado de Lisboa, «toda a pressão para a liberalização dos serviços, para maior desvalorização do trabalho, para mais aumentos da idade para obter direito à reforma, para maiores desregulamentações laborais e sociais». Objectivos que «certamente terão pela frente a oposição dos trabalhadores e das correntes progressistas de diferentes países».
Filipe Diniz, da DORL do PCP, lembrou que «a reconfiguração do Estado ao serviço do capital monopolista constitui uma longa narrativa, que passa por todo o processo de privatizações». Assim, o Estado «não só vem transferindo para o sector privado o que é rentável» como age também no sentido de esses sectores «se tornem ainda mais lucrativos».
Guilherme da Fonseca destacou os ataques à Constuição da República, enquanto que Manuel Gusmão passou em revista a evolução da política cultural. A Eduardo Chitas coube a tarefa de enquadrar a necessidade de ruptura com a política de direita e a Agostinho Lopes caracterizar essa mesma ruptura. Rui Namorado Rosa, do Comité Central, chamou a atenção para a subordinação dos interesses nacionais aos interesses da UE e da NATO.


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