Fim do mandato

Jorge Cadima

O imperialismo é uma máquina de guerra, de pilhagem, de morte e de miséria

Estamos a entrar no último semestre da presidência Bush. Um pouco por toda a parte, as classes dirigentes e os meios de comunicação de massas assobiam para o ar. Parece haver uma ânsia de que termine depressa o mandato de quem tornou patente ao mundo, não apenas que o imperialismo é uma máquina de guerra, de pilhagem, de morte e de miséria, mas também que é vulnerável; que não é invencível e está corroído por crises e contradições profundas. Parecem sonhar com caras novas e discursos de «mudança» que permitam recompor as brechas profundas que se abriram e prosseguir explorações, opressões e guerras antigas.
Mas o mandato de Bush não terminou ainda. E existe o perigo real de que os meses finais do seu poder não sejam apenas datas no calendário. Nos últimos dias, parte importante da comunicação social voltou a falar na iminência de um ataque de Israel ao Irão, com a conivência de Washington (Der Spiegel, 16.6.08; New York Times, 20.6.08). O vice-Primeiro Ministro de Israel, Shaul Mofaz declarou ser «inevitável» um ataque ao Irão, merecendo uma crítica pública do Director-Geral da Agência Internacional de Energia Atómica (Haaretz, 9.6.08).

Talvez sejam apenas ameaças ocas, mas a História aconselha a não subestimar o potencial de violência e morte do imperialismo, em particular quando corroído por crises profundas. Sobretudo quando o discurso político dá lugar ao misticismo, ao fanatismo religioso, aos conceitos de superioridade racial. Surpreende, por isso, o quase absoluto silêncio de noticiários e «comentadores» sobre o conteúdo do discurso oficial de Bush perante o Parlamento de Israel, por ocasião dos 60 anos desse país. Repleto de referências bíblicas e parecendo mais um sermão do que um discurso político, Bush afirmou textualmente, a propósito da criação de Israel: «foi muito mais do que o estabelecimento de um novo país. Foi o pagamento de uma antiga promessa feita a Abraão, a Moisés e David – o de uma pátria para o povo eleito, Eretz Israel» (citação do texto oficial no site da Casa Branca, 15.5.08). «Povo eleito»? «Promessa» divina? Lembremos que este homem tem poderes para mandar disparar o maior arsenal nuclear existente à face da Terra. E acha que se está a «travar um combate com a tecnologia do Século XXI, mas que tem no seu cerne uma antiga batalha entre o bem e o mal». Bush não fez estas afirmações de improviso, mas numa cerimónia oficial, num discurso de Estado que foi seguramente visto à lupa por conselheiros e detentores do poder real nos EUA. Como se deve ler um discurso político com referências bíblicas? Segundo a Bíblia, Deus prometeu a Abraão: «eu darei à tua descendência esta terra, desde o rio do Egipto até ao grande rio Eufrates» (Génesis, 15). É política oficial dos EUA que Eretz Israel se estende do Nilo até à Síria e o Iraque?

Não é demais lembrar que a criação do Estado de Israel tem origens terrenas: a resolução 181 da Assembleia Geral de ONU, de 29 de Novembro de 1947. No seu discurso, Bush apenas refere a ONU para criticar o facto de aprovar moções de condenação a Israel. E apenas refere os palestinos, a quem a Resolução 181 também prometia um Estado, para dizer que talvez daqui a 60 anos (sic!) o venham a ter. Pelos vistos, são filhos de um deus menor.

É com estes EUA que a União Europeia se quer «casar». O Tratado que as classes dirigentes da União Europeia pretendem impor, contra a vontade expressa dos seus povos, institucionaliza as relações entre a NATO e a UE. Militariza a UE para participar nas cruzadas do imperialismo. É uma espécie de consagração da Cimeira das Lajes de Bush, Blair, Aznar e o então quase desconhecido Durão Barroso, que meses mais tarde recebia uma «promoção». E depois ainda se admiram que os povos lhes digam um sonoro «Não!».


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