Problemas de memória

Jorge Cordeiro
Relação de incompatibilidade com o tema tornou recorrente a opção de Cavaco Silva, na sessão solene do 25 de Abril, por umas quantas afirmações esotéricas. Às elocubrações sobre um alegado esgotamento comemorativo da data, Cavaco juntou-lhe este ano a sábia verificação – sustentada na cientifica comprovação que a encomenda de uma sondagem terá garantido – de que é fraco o conhecimento entre os jovens do que esta representou, atribuindo o facto às ilusões que a «classe política» vai semeando. À falta de melhor o tema sempre faculta argumento para a ocasião sem ter de se envolver em abordagens mais sérias sobre aquilo que, representando Abril, continua a ter na política de direita, deste e de anteriores governos, o seu principal factor de negação. Seguramente que fazendo-o encontraria resposta maior para a sua expressada inquietação. Ainda que ao fazê-lo pudesse desaguar num mar de insanáveis contradições e incómodas responsabilidades pessoais. Em matéria de sementeira de ilusões o actual Presidente terá sido, sem dúvida, produtor intensivo. A menos que com a trabalhada alteração de imagem, operada para dar viabilidade à sua candidatura, se tenha ido a memória, Cavaco não poderá deixar de recordar-se do que foram dez anos de governação directa, construída e prolongada sobre um cenário de sucessivas ilusões fossem elas mais elaboradas, como a chamada «geração de sucesso» (moldada na base de uma estimulada despolitização e na procura de um êxito construído sobre o mais rasteiro individualismo e ânsia de poder) ou, mais primárias, de que será exemplo a identificação do seu governo e das suas maiorias como condição de acesso dos portugueses a um bem-estar medido em poder de compra de electrodomésticos. Memória lhe sobrasse e recursos se teriam poupado na encomenda do citado estudo de opinião. Memória lhe restasse e mais facilmente se aperceberia de que as referências criticas à «classe política» com rigor deveriam ser dirigidas às políticas de direita, responsáveis essas sim, não apenas por uma premeditada rasura na sociedade (da escola à opinião pública) sobre Abril, os seus valores e conquistas, mas também, e sobretudo, por uma continuada ofensiva contra direitos e pela negação, também a milhares de jovens, de um futuro de esperança numa vida melhor.


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