Sem surpresa

Vasco Cardoso
Aconteceu como se esperava que acontecesse. Nas últimas eleições legislativas o PS prometeu que realizaria um referendo sobre a chamada Constituição Europeia. Com essa e outras promessas ganhou a maioria dos votos e formou governo. Depois, ordeiramente, durante a presidência portuguesa da União Europeia, obedeceu a tudo quanto havia para obedecer, cumprindo o programa ditado pelas grandes potencias, que culminou com a aprovação de um novo tratado em Lisboa confirmando mais uma machada na soberania e nos direitos do nosso Povo. Quanto ao referendo, enrolou até à última sobre a sua realização, incluindo variadíssimas encenações quanto à pluralidade de opiniões entre socialistas, adiamentos sucessivos sobre a decisão, ou mesmo, a possibilidade de uma surpresa de última hora.
Mas os compromissos do PS não são com os eleitores, nem com o país. O seu vínculo é com o Capital que não quer correr o risco de uma nova rejeição como aconteceu em 2003. E assim, não haverá referendo em Portugal ao novo tratado da UE.
A indignação perante mais uma promessa não cumprida é grande, a surpresa, essa, já é menor. Foi o PS que prometeu não aumentar os impostos e assim que pôde, aumentou o IVA de 19 para 21%. Foi o PS que prometeu alterar aspectos negativos do código do trabalho e ainda esta semana deu a conhecer intenções que vão mais longe na destruição de direitos laborais do que alguma vez foi qualquer um dos outros governos. Foi o PS que prometeu a criação de 150.000 postos de trabalho e o desemprego atingiu neste seu mandato o valor mais alto desde o 25 de Abril. Assim como o vasto rol de medidas que não tendo sido anunciadas em eleições – veja-se o encerramento de serviços de saúde – constituem um eixo central da política do Governo e que são, na prática, uma outra forma de enganar o Povo.
Nos próximos dias, não faltarão vozes a justificar esta actuação por parte do Governo, a começar pelo Presidente da República, mas também pelo PSD, para quem não é estranha esta política e muito menos o hábito de prometer uma coisa e fazer outra. Criaturas iluminadas, independentes, insuspeitas, a quem televisões, rádios e jornais darão amplitude, encarregar-se-ão de justificar esta decisão, como aliás justificam tudo o resto.
A mentira não é um episódio na política de direita, é uma prática que está presente em cada momento e processo. Se há algo de útil que possamos retirar, na luta que levamos por diante, é que, com esta medida do Governo, se tornará ainda mais claro aos olhos de muitos que hesitam perante os truques e as manobras de que são alvo, de que é urgente um outro rumo para Portugal e para a Europa.


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