Degradar para privatizar

Margarida Botelho
Na Maternidade do Hospital Garcia de Orta, em Almada, fazem-se por ano cerca de 4200 partos – o que não deixará de surpreender o Ministro Lino, que só vê deserto na Margem Sul.
Nos últimos meses, tem-se sentido neste serviço a falta de recursos humanos que se vê um pouco por todo o país. Anos de uma política obtusa quanto à formação e fixação dos profissionais no Serviço Nacional de Saúde, os cortes orçamentais, o ataque aos direitos dos trabalhadores da Admnistração Pública e o bloqueio nas admissões e prorrogações de contratos, só poderiam resultar em situações de ruptura, como o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses já alertou. A própria Ordem dos Médicos veio a público comentar que, a manter-se este caminho, «a situação pode tornar-se complicada.»
E é isso que se tem passado no Garcia de Orta: a simples ida de férias de alguns dos 29 médicos do serviço de obstetrícia, obrigou à transferência de grávidas para outras unidades de saúde. Diz o director clínico que está tudo devidamente combinado com os bombeiros e as outras Maternidades, mas que o número de profissionais não é suficiente para garantir todos os partos programados. No mês de Julho, foram transferidas cerca de 15 grávidas, prevê-se número idêntico para Agosto.
Pois agora é que apetece mesmo exigir ao Governo do PS que explique ao povo português para que é que andou a encerrar Maternidades pelo país fora. Se o objectivo era concentrar os recursos nos grandes centros, como diziam, porque é que continuam a faltar numa das maiores maternidades do país? Se há funcionários públicos a mais, porque é que não se conseguem manter os serviços no normalíssimo período de férias de Julho e Agosto? Se a área da saúde materno-infantil é das mais deficitárias em número de trabalhadores e com uma das mais elevadas médias de idade, porque é que o numerus claususPerguntas de resposta fácil para um Governo apostado em transformar o direito dos portugueses à saúde num negócio: primeiro degrada-se, depois privatiza-se.


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