Quem faz as notícias?

Vasco Cardoso
A situação escandalosa em que mergulhou a Universidade Independente, que por arrasto levantou dúvidas a propósito do título académico do Primeiro Ministro, trouxe à luz do dia uma outra realidade que, apesar de muitas vezes ser denunciada pelos comunistas, ganhou expressão pela voz dos próprios protagonistas. Refiro-me à permanente tentativa de manipulação e controlo exercida pelo Governo sobre os órgãos de comunicação social e sobre os jornalistas.
Chefes de redacção, directores de programação, editores de política e outros, reconheceram ter sido contactados pelo gabinete do Primeiro Ministro, e até pelo próprio, no sentido de impedir que fossem tornadas públicas notícias sobre o seu percurso escolar. Reconheceram, ainda, que tal procedimento é regular e habitual não apenas por parte deste governo, como também de governos anteriores. Mas, em vez da indignação e da denúncia, cada um dos envolvidos optou por reiterar que não se tratou de qualquer tipo de pressão ou condicionamento da liberdade (e da obrigação) de informar o público.
Como temos dito, a ofensiva desenvolvida pelo Governo PS tem sido facilitada, em larga medida, pelo posicionamento da comunicação social dominante que, registe-se, está hoje concentrada nas mãos de quatro grandes grupos económicos - Impresa; Cofina; Media Capital; Impala – isto para além do próprio Estado (RDP, RTP e Lusa) e da Igreja (Grupo Renascença e uma parte significativa da imprensa regional). Os benefícios que o grande capital tem retirado desta política estão, por sua vez, reflectidos na forma como a comunicação social (propriedade sua) se posiciona em relação às medidas do Governo. Isto, pelo menos para já.
A necessidade de controlo dos media por parte do Governo não se fica (nem descansa) nas relações de propriedade e promiscuidade entre poder político, poder económico e órgãos de comunicação social, estende-se também à definição diária do conteúdo dos telejornais, dos noticiários das rádios ou das notícias de jornais. Intromete-se na escolha das chefias das redacções, de comentadores e analistas políticos (cada vez em maior número). Procura determinar o assunto, a agenda do dia, o facto político. Prepara e aprova legislação, nomeadamente um novo Estatuto do Jornalista, cujo objectivo é consolidar estes mecanismos de manipulação informativa.
Os telefonemas que Sócrates fez nestes dias não foram um impulso ou um gesto pouco reflectido, são uma prática que ilustra o facto de que a censura do nosso tempo não está assim tão distante do lápis azul.


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