Não a uma «Santa aliança» UE-EUA

Albano Nunes

Uma «Santa aliança» contra os trabalhadores e contra os povos

A visita realizada a semana passada aos EUA pela Chanceler da Alemanha, Ângela Merkel, reveste-se de um significado político muito grave.
Desde logo porque, perante o desconcerto e a crise em que as derrotas no Iraque mergulharam a classe dirigente norteamericana, tal visita funcionou como autêntico pronto socorro à política agressiva dos EUA e à sua corrente mais aventureira. George W. Bush tem razão para se sentir confortado na sua opção pela escalada da guerra; Merkel não pode desconhecer que a «nova estratégia para a vitória» que Bush se propõe entretanto oficializar, e envolvendo o envio de novos contingentes militares para o Iraque, é uma estratégia de ocupação que anuncia uma repressão ainda mais massiva e brutal.

Depois porque a «grande» Alemanha, não só decide marcar o início da sua Presidência da União Europeia precisamente com um encontro de Merkel com Bush, apesar de profundamente desacreditado, como atribui a este gesto profundamente simbólico uma dimensão estratégica. O que aqui se questiona não é obviamente um normal acto de diplomacia mas a sua oportunidade e o seu conteúdo político. É nisto que há lugar para a maior inquietação. Sem subestimar reais rivalidades e contradições, a verdade é que a concertação inter-imperialista continua a predominar. E o reforço da UE como bloco económico-político-militar imperialista (em que Berlim ocupa uma posição de crescente liderança), continua a ser acompanhado pelo reforço de uma relação com os EUA, que tende a assumir cada vez mais os contornos de uma «Santa aliança» contra os trabalhadores e contra os povos para a recolonização do planeta.

Se alguém tivesse dúvidas quanto à natureza das relações que o grande capital e as grandes potências pretendem tecer entre os dois polos atlânticos do imperialismo, basta atentar nas afirmações que, segundo a imprensa, foram feitas por Merkel em entrevista ao «Financial Times» antes da visita – «Os nossos sistemas económicos baseiam-se nos mesmos valores (...) Enfrentamos a mesma dura concorrência dos mercados asiáticos e, no futuro, da América Latina. Temos de unir forças.» – ou durante a estadia em Washington - «O facto desta visita acontecer [nesta ocasião] não é certamente coincidência. É a expressão clara de que partilhamos os mesmos valores, de que há muitos interesses comuns entre os nossos dois países e de que há também uma grande necessidade de melhorar a cooperação entre a UE e os EUA». Na sequência das decisões da cimeira da NATO de Riga que apontam para o reforço da cooperação «euro-americana» no âmbito desta aliança militar agressiva, do crescente envolvimento da Alemanha em operações militares no estrangeiro e da partilha de tarefas no Afeganistão, no Iraque, no Líbano, na Palestina e noutras regiões, o que se conhece da visita de Merkel aos EUA aponta, não para a «afirmação autónoma da Europa» que os federalistas de todos os matizes invocam para justificar uma UE/bloco imperialista, mas para o reforço da «aliança transatlântica» com uma política cada vez mais reaccionária, exploradora e agressiva. Mesmo a anunciada cooperação para o relançamento do «road map» israelo-palestiniano não pronuncia nada de bom para a causa libertadora palestiniana e a paz no Médio Oriente. E o facto de a esta visita se seguir imediatamente a do Presidente da Comissão Europeia Durão Barroso, o lamentável anfitrião da «cimeira da guerra» dos Açores e paladino do «atlantismo», torna as coisas ainda mais preocupantes.

Impõe-se por isso redobrar a vigilância em relação às manobras do imperialismo. O facto de Portugal deter a Presidência da UE na segunda metade deste ano e de, em coerência com a sua política de subserviência ao imperialismo, o Governo do PS se preparar para transformar essa Presidência em simples barriga de aluguer daquilo que a Presidência alemã lhe indicar, coloca aos portugueses acrescidas responsabilidades. É necessário agir para dar um vigoroso impulso à luta contra a UE do grande capital, contra a «Santa aliança» imperialista que Bush e Merkel pretendem construir, por uma outra Europa de paz, progresso e cooperação, solidária com os povos que lutam pela sua libertação.


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