Crimes por proporção
Aos que imaginariam que dificilmente ocorreria a qualquer pessoa de bem, perante a criminosa ofensiva de Israel contra a Palestina e o Líbano, outro sentimento que não fosse o de inteira indignação, reprovação e denúncia, a posição de uma certa comunidade internacional – com os Estados Unidos e a União Europeia à cabeça e a política externa nacional puxada pela trela – aí está para os desmentir. A única e mais ousada expressão que os ocidentais guardiões dos direitos humanos alcançam, perante a hedionda onda de crimes sionistas e o espezinhamento do direito internacional, é a de a considerarem «desproporcionada». Para estes é tudo um problema de «proporção». É verdade que se fica sem perceber, por falta da devida clarificação, qual o padrão de proporcionalidade tido como razoável para o caso presente. Aguarda-se assim com expectativa os esclarecimentos adicionais em falta, o valor da medida que em concreto tornaria razoável a agressão israelita, o número de crianças e civis vitimadas pelos bombardeamentos, abaixo do qual se consideraria a coisa proporcionada, o volume de pontes e quarteirões arrasados que tornariam a agressão justificada, a tonelagem de bombas lançadas abaixo da qual a ofensiva se conteria nos limites do tolerável. Supõe-se que o debate sobre estes e outros relevantes factores estratégicos e humanitários esteja em curso nas mais altas esferas do Pentágono, da União Europeia e da Nato. Tudo sem pressas, porque o rigor semântico da expressão a isso obriga e também porque, em matéria de proporcionalidade, Israel vai fazendo o seu caminho: de acordo com o ministro da defesa israelita por cada projéctil lançado contra o seu território dez edifícios libaneses ver-se-ão arrasados. O mundo conhece de há muito os critérios de proporcionalidade de Israel assentes na mais impune unilateralidade. Uma unilateralidade que lhe dá o direito de manter territórios de estados vizinhos sob ocupação, de sequestrar e encarcerar centenas de palestinianos, de violar fronteiras, de assassinar mulheres e crianças, tudo sob o silêncio sepulcral das Nações Unidas e o discreto, mas estimulante, aplauso dos seus aliados ocidentais. Os crimes de guerra e o rasto de sangue deixado por Israel na Palestina e no Líbano responsabilizam não apenas a política fascista do governo israelita mas também os países e potências imperialistas que estimulam a sua acção e têm nela um instrumento de concretização dos seus objectivos estratégicos no médio oriente.