O vírus
A competição ainda não começou, mas as bandeiras já despontam nas janelas, dezoito mil mulheres foram ao estádio do Jamor fazer a «mais bela» e a maior bandeira humana – com entrada directa para o Guiness, segundo consta –, e a Selecção nacional conta desde domingo com a benção de um bispo Nobel da Paz, no caso o timorense D. Ximenes Belo, que se deslocou expressamente a Évora para manifestar o seu apoio aos jogadores.
Seria injusto não reconhecer o esforço (e os meios) que para a concretização de tão nobres desígnios despenderam diversas entidades, públicas e privadas.
«A mais bela bandeira do Mundo», como teve a bondade de lembrar o secretário de Estado do Desporto, Laurentino Dias, presente no Jamor, foi uma iniciativa da Federação Portuguesa de Futebol, do BES (o grupo de Ricardo Salgado) e do Instituto Português da Juventude. Este último organismo disponibilizou os autocarros que levaram ao Jamor as mulheres vindas um pouco de todo o País, com o beneplácito de Laurentino Dias, que ao contrário de outros membros do Governo não considera bacoco o nacionalismo, pelo menos no caso do futebol, pelo que aproveitou a oportunidade para saudar, ao melhor estilo do Movimento Nacional Feminino, «o bom espírito português para se juntar, solidarizar e emocionar» no apoio à Selecção.
Segundo as nossas fontes, o secretário de Estado esqueceu-se no entanto de referir outro contributo inestimável, a SIC, que durante dias e dias apelou repetidamente à participação no evento (cujo parece assinalar também o fim do litígio entre Pinto Balsemão, via Expresso, e o BES). Com tanto denodo o fez que o proveito veio à tona, com a estação de Carnaxide a obter no sábado o melhor resultado do ano, vencendo o dia com 31,2% de ‘share’.
Posto isto e os factos, sobejam motivos para temer que o País esteja de novo a incubar essa estranha doença que à falta de melhor podemos designar por febre nacional-futebolística, que deixa os pacientes em estado de euforia e alienação colectiva antes de mergulharem em profunda depressão, seja qual for o resultado da Selecção, mal o campeonato chegue ao fim.
O governo de Sócrates, tal como os seus congéneres por esse mundo fora, não só estimula como cavalga a onda do vírus «desportivo», fazendo de conta que é sinónimo de confiança, sinal de retoma, demonstração de sucesso. Com os espíritos entretidos com o futebol (e com as touradas e os fados e os casinos e as galas e os festivais… que infestam o dia a dia televisivos a lembrar cada vez mais as programações do fascismo), é de esperar que não sobre muito tempo para o «resto».
O encerramento de empresas e o desemprego ficarão ao recato de manchetes, tal como as 100 000 crianças em risco existentes em Portugal, o assalto à Segurança Social, o aumento da idade de reforma, a liquidação do Serviço Nacional de Saúde, do direito à educação, à habitação condigna, etc., etc., etc..
Cá como no resto do mundo, a hora é de futebol e de exploração de gente mais ou menos bem intencionada. Enquanto isso, como há tempos revelou a Unicef, no Brasil – paradigmático exemplo do binómio samba/fado e futebol – uma criança morre a cada cinco minutos, na maioria dos casos de fome. O que representa cerca de 290 por dia. O correspondente a dois ‘Boeings 737’ de crianças mortas por dia. Sem direito a estádios, nem cobertura televisiva, nem bispos, nem registo no Guiness.
Seria injusto não reconhecer o esforço (e os meios) que para a concretização de tão nobres desígnios despenderam diversas entidades, públicas e privadas.
«A mais bela bandeira do Mundo», como teve a bondade de lembrar o secretário de Estado do Desporto, Laurentino Dias, presente no Jamor, foi uma iniciativa da Federação Portuguesa de Futebol, do BES (o grupo de Ricardo Salgado) e do Instituto Português da Juventude. Este último organismo disponibilizou os autocarros que levaram ao Jamor as mulheres vindas um pouco de todo o País, com o beneplácito de Laurentino Dias, que ao contrário de outros membros do Governo não considera bacoco o nacionalismo, pelo menos no caso do futebol, pelo que aproveitou a oportunidade para saudar, ao melhor estilo do Movimento Nacional Feminino, «o bom espírito português para se juntar, solidarizar e emocionar» no apoio à Selecção.
Segundo as nossas fontes, o secretário de Estado esqueceu-se no entanto de referir outro contributo inestimável, a SIC, que durante dias e dias apelou repetidamente à participação no evento (cujo parece assinalar também o fim do litígio entre Pinto Balsemão, via Expresso, e o BES). Com tanto denodo o fez que o proveito veio à tona, com a estação de Carnaxide a obter no sábado o melhor resultado do ano, vencendo o dia com 31,2% de ‘share’.
Posto isto e os factos, sobejam motivos para temer que o País esteja de novo a incubar essa estranha doença que à falta de melhor podemos designar por febre nacional-futebolística, que deixa os pacientes em estado de euforia e alienação colectiva antes de mergulharem em profunda depressão, seja qual for o resultado da Selecção, mal o campeonato chegue ao fim.
O governo de Sócrates, tal como os seus congéneres por esse mundo fora, não só estimula como cavalga a onda do vírus «desportivo», fazendo de conta que é sinónimo de confiança, sinal de retoma, demonstração de sucesso. Com os espíritos entretidos com o futebol (e com as touradas e os fados e os casinos e as galas e os festivais… que infestam o dia a dia televisivos a lembrar cada vez mais as programações do fascismo), é de esperar que não sobre muito tempo para o «resto».
O encerramento de empresas e o desemprego ficarão ao recato de manchetes, tal como as 100 000 crianças em risco existentes em Portugal, o assalto à Segurança Social, o aumento da idade de reforma, a liquidação do Serviço Nacional de Saúde, do direito à educação, à habitação condigna, etc., etc., etc..
Cá como no resto do mundo, a hora é de futebol e de exploração de gente mais ou menos bem intencionada. Enquanto isso, como há tempos revelou a Unicef, no Brasil – paradigmático exemplo do binómio samba/fado e futebol – uma criança morre a cada cinco minutos, na maioria dos casos de fome. O que representa cerca de 290 por dia. O correspondente a dois ‘Boeings 737’ de crianças mortas por dia. Sem direito a estádios, nem cobertura televisiva, nem bispos, nem registo no Guiness.