Envelhecimento e Segurança Social

Breves observações

Fernanda Mateus (Membro da Comissão Política do CC do PCP)
O Primeiro-Ministro afirmou, no recente debate mensal na Assembleia da República (27 de Abril), que a sustentabilidade financeira da Segurança Social está comprometida a prazo em resultado da dinâmica demográfica: «Por um lado, lado as pessoas vivem hoje mais tempo e, portanto estão durante mais tempo a receber as suas reformas. Por outro lado, há cada vez menos pessoas a trabalhar para garantir o pagamento dessas reformas.»

O Governo pretende perpetuar as pensões baixas

Partindo de projecções alarmistas sobre a evolução das tendências demográficas a longo prazo, que estão longe de estar devidamente fundamentadas, o Governo apresenta como solução «milagrosa» o aumento da idade de reforma para os 67 e 68 anos no que toca aos trabalhadores do sector privado da economia, na sequência do aumento já verificado dos 60 para os 65 anos na idade de reforma dos trabalhadores da administração pública. Pretende, ainda, alterar os critérios de actualização dos aumentos anuais de pensões, ligando-os ao desempenho da economia. O que, na prática, significa perpetuar os baixos valores das pensões e das reformas, quando a maioria dos reformados e pensionistas se encontram em situação de pobreza e os baixos salários dos(as) trabalhadores(as) se vão repercutir em baixas reformas no futuro.
As projecções alarmistas dos dados demográficos são usadas, não ao serviço do aprofundamento do papel do Sistema Público de Segurança Social - no cumprimento dos seus fins e de acordo com o que a Constituição da República –, mas ao serviço dos «magnos» objectivos das políticas neoliberais que, na Segurança Social, pretendem libertar o Estado da sua responsabilidade de defender e consolidar o Sistema Público através da ampliação das fontes de receitas para cumprir e aprofundar os direitos que decorrem das contribuições dos trabalhadores e igualmente e dos cidadãos que se encontram em situação de vulnerabilidade económica e social ou em situação de pobreza.
Porque se é verdade que o «número de activos por pensionista tem diminuído em Portugal devido ao envelhecimento da população, é também verdade que o crescimento da riqueza criada por empregado aumentou muito mais. De acordo com os dados oficiais, entre 1975 e 2004, o número de activos por pensionista diminuiu de 3,78 para 1,63, ou seja, baixou 2,3 vezes; no entanto, no mesmo período de tempo, a riqueza criada por empregado cresceu 41 vezes pois, segundo o Banco de Portugal, o PIB por empregado subiu de 640 euros para 26.300 euros.»
Relacionam-se as questões da sustentabilidade financeira da Segurança Social e os seus eventuais desequilíbrios futuros com as despesas no pagamento das pensões, mas omite-se que é crescente o fosso na distribuição do rendimento entre os que produzem a riqueza – os(as) trabalhadores(as) - e os que dela se apropriam (os grandes grupos económicos). E que a progressiva destruição do aparelho produtivo nacional alimenta a actividade especulativa, como fonte de lucro que reverte integralmente para os bolsos de alguns.

Organizar o protesto e a luta

O Governo do PS não aponta, assim, para medidas que aprofundem o Sistema Público, como instrumento de redistribuição do rendimento nacional e que visem alargar as fontes de financiamento da Segurança Social. Pelo contrário, o Governo e a sua maioria parlamentar recusaram as propostas do PCP que visavam alargar as fontes de financiamento da Segurança Social através da criação de uma nova contribuição às empresas em função do seu Valor Acrescentado Bruto e a criação de um imposto extraordinário de 0,25% sobre todas as transacções realizadas na Bolsa, cuja receita reverteria integralmente para o Fundo de Estabilização Financeira de Segurança Social até que aquele fundo assegurasse a cobertura de despesas previsíveis com pensões, por um período mínimo de dois anos . Não se apontam medidas que revertam o «passo de caracol» na recuperação das dívidas à Segurança Social por parte das empresas. Dívida que, entre 2004 e 2005, passou de 2.900 milhões de euros para 3. 400 milhões de euros. A manterem-se os actuais ritmos de recuperação serão precisos 11 anos para recuperar a dívida declarada em 2005.
A natureza e objectivos da «reforma estrutural da Segurança Social» que o Governo pretende levar a cabo está ao serviço do grande capital financeiro e do grande patronato. Está ao serviço das políticas neoliberais. O PSD e CDS-PP não fariam melhor.
Mas por mais mistificações por parte do Governo e do Primeiro Ministro, as políticas em curso não respondem às exigências de reaquacionar as respostas sociais que o aumento da esperança de vida impõe. Estas respostas impõem novas políticas económicas e sociais orientadas para o desenvolvimento económico e uma justa distribuição da riqueza, para a defesa de um Serviço Nacional de Saúde que promova a saúde e o bem-estar dos idosos e para a consolidação do Sistema Público de Segurança Social que garanta a autonomia económica dos reformados, mas igualmente a resposta à diversidade das suas necessidades específicas.
Aos reformados e pensionistas, aos trabalhadores cabe a resposta necessária: organizar o protesto e a luta.


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