Em nome da fé
«Qualquer relação sexual que não seja dirigida à procriação é uma perversão».
«A família só existe a partir do momento em que há filhos».
«O aborto é pior do que a pedofilia».
«Promover a utilização do preservativo é uma grande irresponsabilidade».
«A homossexualidade é uma doença (...) de origem psicológica, um sintoma de uma neurose relacionada com um complexo de inferioridade».
«A esperança média de vida dos homossexuais activos é de 45 anos, sem contar com aqueles que morrem de sida».
Ao contrário do que se possa pensar, as frases atrás referidas não constam de nenhum manual extremista, embora exprimam de forma lapidar qual o código de conduta por que se pauta o extremista que as concebeu, o muito católico padre franciscano Nuno Serras Pereira (NSP).
O sacerdote, cujo currículo averba uma pouco dignificante condenação por difamação por apelidar a Associação para o Planeamento da Família (APF) de «organização ‘serial killer’», ganhou notoriedade há cerca de um ano quando fez publicar um anúncio no jornal Público dando conta que não dava a comunhão a quem utilizasse métodos contraceptivos.
Na época, NSP escudou a sua posição no Código de Direito Canónico, que impede o sacramento a quem não respeite os Mandamentos. Os protestos de paroquianos levaram então alguns responsáveis da igreja católica a afirmar que o franciscano fazia uma leitura abusiva dos princípios da igreja, mas tudo leva a crer que o padre não foi instado a modificar a sua postura nem sequer a dar provas de maior continência verbal.
Esta conclusão baseia-se na recente entrevista dada por NSP ao Independente (edição de 10 de Fevereiro de 2006), de onde justamente se respigaram as enormidades citadas no início.
Numa altura em que tanto se fala de extremismos e de ofensas aos sentimentos religiosos do mundo muçulmano, não deixa de ser curioso registar o silêncio de chumbo com que as autoridades católicas portuguesas acolheram os dislates do seu pastor. O facto legitima a suspeição de que não será por acaso que NSP continua a debitar tudo o que lhe apetece, ou seja, que a NSP cabe dizer em voz alta o que os sectores mais conservadores da igreja efectivamente pensam mas não ousam ou não têm interesse em afirmar.
Sem questionar as razões editoriais que levaram o Independente a entrevistar o franciscano, vale a pena atentar na oportunidade de dar voz a um prelado que não destoaria no mais refinado coro dos tempos áureos da inquisição. Basta pensar que a questão da educação sexual nas escolas, com carácter obrigatório, está uma vez mais na ordem do dia, que a polémica dos casamentos homossexuais chegou, como seria inevitável, a Portugal, e que a problemática da descriminalização do aborto permanece em aberto, exigindo do PS a definição de uma posição que já tarda.
Nada melhor, pois, do que fazer avançar o desbocado franciscano, que de tão retrógrado e reaccionário permite aos conservadores vestir a pele de moderados e progressistas, garantindo assim que alguma coisa possa mudar para que tudo continue na mesma. Dir-se-ia que em nome da religião vale tudo... desde que seja a nossa.
«A família só existe a partir do momento em que há filhos».
«O aborto é pior do que a pedofilia».
«Promover a utilização do preservativo é uma grande irresponsabilidade».
«A homossexualidade é uma doença (...) de origem psicológica, um sintoma de uma neurose relacionada com um complexo de inferioridade».
«A esperança média de vida dos homossexuais activos é de 45 anos, sem contar com aqueles que morrem de sida».
Ao contrário do que se possa pensar, as frases atrás referidas não constam de nenhum manual extremista, embora exprimam de forma lapidar qual o código de conduta por que se pauta o extremista que as concebeu, o muito católico padre franciscano Nuno Serras Pereira (NSP).
O sacerdote, cujo currículo averba uma pouco dignificante condenação por difamação por apelidar a Associação para o Planeamento da Família (APF) de «organização ‘serial killer’», ganhou notoriedade há cerca de um ano quando fez publicar um anúncio no jornal Público dando conta que não dava a comunhão a quem utilizasse métodos contraceptivos.
Na época, NSP escudou a sua posição no Código de Direito Canónico, que impede o sacramento a quem não respeite os Mandamentos. Os protestos de paroquianos levaram então alguns responsáveis da igreja católica a afirmar que o franciscano fazia uma leitura abusiva dos princípios da igreja, mas tudo leva a crer que o padre não foi instado a modificar a sua postura nem sequer a dar provas de maior continência verbal.
Esta conclusão baseia-se na recente entrevista dada por NSP ao Independente (edição de 10 de Fevereiro de 2006), de onde justamente se respigaram as enormidades citadas no início.
Numa altura em que tanto se fala de extremismos e de ofensas aos sentimentos religiosos do mundo muçulmano, não deixa de ser curioso registar o silêncio de chumbo com que as autoridades católicas portuguesas acolheram os dislates do seu pastor. O facto legitima a suspeição de que não será por acaso que NSP continua a debitar tudo o que lhe apetece, ou seja, que a NSP cabe dizer em voz alta o que os sectores mais conservadores da igreja efectivamente pensam mas não ousam ou não têm interesse em afirmar.
Sem questionar as razões editoriais que levaram o Independente a entrevistar o franciscano, vale a pena atentar na oportunidade de dar voz a um prelado que não destoaria no mais refinado coro dos tempos áureos da inquisição. Basta pensar que a questão da educação sexual nas escolas, com carácter obrigatório, está uma vez mais na ordem do dia, que a polémica dos casamentos homossexuais chegou, como seria inevitável, a Portugal, e que a problemática da descriminalização do aborto permanece em aberto, exigindo do PS a definição de uma posição que já tarda.
Nada melhor, pois, do que fazer avançar o desbocado franciscano, que de tão retrógrado e reaccionário permite aos conservadores vestir a pele de moderados e progressistas, garantindo assim que alguma coisa possa mudar para que tudo continue na mesma. Dir-se-ia que em nome da religião vale tudo... desde que seja a nossa.