Legal e democraticamente

José Casanova
É sabido que para a generalidade dos comentadores e analistas políticos com lugar activo nos média à escala planetária, os Estados Unidos da América são o modelo acabado de democracia, o país da liberdade, a pátria dos direitos humanos, etc. Sabe-se, igualmente, que de tantas vezes repetida, a mentira foi aceite como verdade por milhões de pessoas, não sendo de excluir, até, que alguns desses comentadores e analistas – nomeadamente entre os que lemos e ouvimos na comunicação social dominante no nosso País – à força de tanto a divulgarem tenham, eles próprios, passado a acreditar nela…
Há duas semanas, trouxemos aqui exemplos dessas excelências democráticas made in USA: lembrámos a situação desumana em que vivem milhares de cidadãos encarcerados em prisões à ordem do Governo de Bush, desprovidos de quaisquer direitos, totalmente sujeitos às arbitrariedades dos carcereiros e interrogadores. E lembrámos que essas prisões estão espalhadas por dezenas de países cujos governos - todos eles, certamente, democraticamente eleitos e avalizados como exemplos de prática democrática – cumprem o papel de lacaios para todo o serviço do imperialismo norte-americano.
Eis uma outra manifestação do conceito de democracia e de liberdade em vigor nos EUA: de acordo com uma notícia vinda a público no Correio da Manhã, a União Americana de Liberdades Civis (ACLU) denunciou recentemente que grande número de cidadãos norte-americanos estão a ser espiados. Segundo a ACLU, o FBI, ao abrigo da chamada Lei Antiterrorista, aprovada após o 11 de Setembro, desencadeou uma operação de vigilância em larga escala. Entre os que são objecto da severa vigilância policial, contam-se sindicalistas, membros de grupos pacifistas, defensores dos direitos dos animais e membros de associações humanitárias que distribuem alimentos aos pobres em bairros degradados. Mas o leque de vigiados é, seguramente, muito mais amplo. Com efeito, o FBI leva as suas preocupações com o terrorismo ao ponto de – para além de «infiltrar espiões em sindicatos, em grupos pacifistas e, até, na associação nacional de advogados» - controlar os livros requisitados pelos frequentadores das bibliotecas públicas.
Mas não chega: é preciso apertar a vigilância. E para isso – isto é, para conceder mais poderes ao FBI - o Senado vai proceder à revisão da Lei Antiterrorista. Para que tudo seja feito legal e democraticamente.


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