O nome da coisa

Anabela Fino
Ao contrário do que se poderia esperar, tendo presente o «terramoto» político provocado pelo «caso Marcelo», a divulgação pela revista Visão, na semana passada, dos planos do Governo para pôr de pé uma «central de comunicação» não suscitou grande polémica.
O tema voltou a ser abordado anteontem, terça-feira, pelo jornal Público, numa notícia onde se dá conta que o novo Gabinete de Informação e Comunicação (GIC) a ser criado na Presidência do Conselho de Ministros custará cerca de dois milhões de euros, conforme previsto no Orçamento do Estado.
A «central de comunicação», como já foi baptizado o GIC, foi aprovada em Conselho de Ministros, segundo o mesmo jornal, e deverá entrar em funções no final do ano ou no início de 2005.
Entre as competências da central, refere ainda o Público, conta-se a produção de comunicação sobre as políticas públicas e a acção do governo; o estabelecimento de relações com os meios de comunicação social; o apoio a assessorias e outras estruturas de imprensa; o planeamento e apoio de campanhas de informação a promover.
O caderno de encargos não se fica por aqui, mas para o que interessa o atrás exposto chega e sobra. Temos assim que o Governo PSD-CDS/PP, não contente com a panóplia de comentadores residentes ou de arribação de que dispõe nos média; insatisfeito com as constantes prestações de ministros, secretários de Estado, assessores e homens de mão em tudo quanto é canal televisivo e radiofónico, jornais nacionais, regionais e folhas de paróquia, quer mais, muito mais.
Está talvez desagradado com as ferroadas recebidas aqui e ali, quando a escandaleira é muita e as comadres se zangam. Acha talvez que é escassa a discriminação praticada relativamente aos que ousam dizer que «o rei vai nu». Anseia, quem sabe, por começar o dia com louvores à sua excelência e hinos à sua perfeição. Qualquer coisa assim como os placares que Santana semeou pela capital enquanto esteve à frente da Câmara de Lisboa: «Já reparou como o Governo é bom?»
E que melhor forma para alcançar tal desiderato do que contratar profissionais, especialistas nas artes de dourar a pílula, relações públicas eméritos na arte de domar jornalistas renitentes, juntá-los numa GIC com olhos e ouvidos em todo o lado, bem oleada e dotada de meios?
Em tempos não tão distantes como isso uma coisa assim chamava-se de outro modo. Mas os tempos agora são outros, ainda que os objectivos sejam os mesmos. Há que ser democrata. E para isso nada melhor do que uma «central de comunicação» sempre pronta a lembrar que até os cães de fila só podem ladrar baixinho.


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