Dois e dois são quatro?
É sabido que as estatísticas não deviam dar para tudo, mas dão quando falta seriedade a quem as trata. Hoje apresentamos dois casos de manipulação de números, quando – pobres deles! – caem nas mãos de gente sem escrúpulos. No primeiro, a manipulação é feita por quem está no governo, no segundo por quem quer estar.
Peru: as manipulações estatísticas de Toledo
O esforço conjugado das políticas do Fundo Monetário Internacional com o seguidismo neo-liberal da oligarquia local conseguiu fazer da pobreza a maior indústria peruana, pelo que hoje uma grande discussão nacional é saber realmente qual é a «produção» dessa imensa fábrica. No seu último discurso sobre o estado da nação, Toledo – a braços com um cada vez mais reduzido nível de apoio popular – veio a público dizer das maravilhas do seu governo. Apoiado nalguns números macroeconómicos – já se sabe que isso poucas vezes tem a ver com a melhoria de vida das populações – o troca-tintas peruano, comparando períodos desiguais, quis enfiar o barrete à população com a peta de que entre 2003 e 2004 o índice nacional de pobres tinha descido de 54,7 por cento para 52 e que, nas zonas rurais, a queda tinha sido de 78 para 73 por cento. Mentiras não eram ditas e logo Javier Herrera, o autor do relatório, bradou ao céu para dizer que Toledo retocara os números e que os pobres tinham crescido em 190 mil unidades.
Para maior desgraça do «cholo» vendido ao império, outra economista, Patrícia Stewart, confirmou os dados de Herrera, chegando mesmo a dizer que o número de pobres tinha aumentado em 200 mil. Entretanto, outros especialistas ligados a centros de estudos estatísticos vieram à praça pública afirmar igualmente que Toledo manipulara as cifras para dar uma falsa impressão dos resultados do seu governo e ficar bem na fotografia. O retoque não foi bom e a imagem ficou tremida…
Venezuela: as últimas sondagens... e uma de «última hora»
Olhos amigos e inimigos estão sobre a Venezuela que dentro de dias irá a uma consulta política inédita: o revogatório presidencial. As últimas sondagens dão como vencedor o movimento bolivariano, com uma margem bastante confortável sobre a reacção atrincheirada na Coordenadora Democrática, principal organização opositora recheada de políticos do antigo regime e de aventureiros de nova geração, que têm dado abundantes provas de golpistas e muito poucas de democratas.
Vejamos alguns números em percentagens. Segundo a empresa Keller, ligada à oposição, o «Não» (voto a favor do processo bolivariano) ganha por 45 contra 34. Para Datos, igualmente próxima da oposição, o «Não» ganha 51 a 39. Indaga arroja 55 contra 42. Hintercables informa de 51 contra 40. Duas empresas norte-americanas apontam na mesma direcção: a Evans McDonough estima que será 51 vs 43 e a North American Opinion Research estabelece as cifras em 60 e 35. Sendo assim, é óbvio que a oposição está muito pouco interessada nesta «guerra» de sondagens e decidiu tirar do chapéu uma sondagem de «última hora» mais a seu jeito.
No dia 4 de Agosto, El Universal, jornal de circulação nacional, publicou na primeira página uma sondagem atribuída ao Instituto Venezuelano de Análise de Dados onde o «Não» perdia 44 contra 50. Quase imediatamente, o director do jornal era forçado a reconhecer na sua página na internet que o director do instituto, o especialista Félix Seijas, declarava que a sondagem não tinha sido realizada pela sua organização nem tinha nada a ver com a sua publicação. Contudo, o diário, ainda que desconhecendo por completo a origem da mesma, ratificava que a sondagem existia fisicamente, que não tinha sido inventada, mas admitia que lhe tinha chegado por um e-mail, evidentemente não verificado. Veio depois a saber-se que o e-mail em questão era só para «pessoas de confiança» e que, «no caso de ser reenviado», não deveria revelar o remetente original.
Mas a história segue
No dia 6, outro jornal da oposição, El Mundo, publicava também na primeira página a mesma sondagem, agora com outros «autores». O escândalo foi tão medonho que o dono do diário mandou recolher a edição e lançar outra com um encabeçado totalmente diferente. A primeira «noticiava» a derrota do «Não» por 51 contra 43 e a segunda, a oito colunas, eram tão inócua como «Mobilizações animam a rua». Da original ficaram alguns exemplares para a história e já estão na internet ( www.rnv.gov.ve ).
Brincar com os números é certamente grave, mas o mais grave é que a oposição venezuelana não dá qualquer sinal de aceitar um resultado desfavorável e continuar a pensar numa aventura golpista.
Peru: as manipulações estatísticas de Toledo
O esforço conjugado das políticas do Fundo Monetário Internacional com o seguidismo neo-liberal da oligarquia local conseguiu fazer da pobreza a maior indústria peruana, pelo que hoje uma grande discussão nacional é saber realmente qual é a «produção» dessa imensa fábrica. No seu último discurso sobre o estado da nação, Toledo – a braços com um cada vez mais reduzido nível de apoio popular – veio a público dizer das maravilhas do seu governo. Apoiado nalguns números macroeconómicos – já se sabe que isso poucas vezes tem a ver com a melhoria de vida das populações – o troca-tintas peruano, comparando períodos desiguais, quis enfiar o barrete à população com a peta de que entre 2003 e 2004 o índice nacional de pobres tinha descido de 54,7 por cento para 52 e que, nas zonas rurais, a queda tinha sido de 78 para 73 por cento. Mentiras não eram ditas e logo Javier Herrera, o autor do relatório, bradou ao céu para dizer que Toledo retocara os números e que os pobres tinham crescido em 190 mil unidades.
Para maior desgraça do «cholo» vendido ao império, outra economista, Patrícia Stewart, confirmou os dados de Herrera, chegando mesmo a dizer que o número de pobres tinha aumentado em 200 mil. Entretanto, outros especialistas ligados a centros de estudos estatísticos vieram à praça pública afirmar igualmente que Toledo manipulara as cifras para dar uma falsa impressão dos resultados do seu governo e ficar bem na fotografia. O retoque não foi bom e a imagem ficou tremida…
Venezuela: as últimas sondagens... e uma de «última hora»
Olhos amigos e inimigos estão sobre a Venezuela que dentro de dias irá a uma consulta política inédita: o revogatório presidencial. As últimas sondagens dão como vencedor o movimento bolivariano, com uma margem bastante confortável sobre a reacção atrincheirada na Coordenadora Democrática, principal organização opositora recheada de políticos do antigo regime e de aventureiros de nova geração, que têm dado abundantes provas de golpistas e muito poucas de democratas.
Vejamos alguns números em percentagens. Segundo a empresa Keller, ligada à oposição, o «Não» (voto a favor do processo bolivariano) ganha por 45 contra 34. Para Datos, igualmente próxima da oposição, o «Não» ganha 51 a 39. Indaga arroja 55 contra 42. Hintercables informa de 51 contra 40. Duas empresas norte-americanas apontam na mesma direcção: a Evans McDonough estima que será 51 vs 43 e a North American Opinion Research estabelece as cifras em 60 e 35. Sendo assim, é óbvio que a oposição está muito pouco interessada nesta «guerra» de sondagens e decidiu tirar do chapéu uma sondagem de «última hora» mais a seu jeito.
No dia 4 de Agosto, El Universal, jornal de circulação nacional, publicou na primeira página uma sondagem atribuída ao Instituto Venezuelano de Análise de Dados onde o «Não» perdia 44 contra 50. Quase imediatamente, o director do jornal era forçado a reconhecer na sua página na internet que o director do instituto, o especialista Félix Seijas, declarava que a sondagem não tinha sido realizada pela sua organização nem tinha nada a ver com a sua publicação. Contudo, o diário, ainda que desconhecendo por completo a origem da mesma, ratificava que a sondagem existia fisicamente, que não tinha sido inventada, mas admitia que lhe tinha chegado por um e-mail, evidentemente não verificado. Veio depois a saber-se que o e-mail em questão era só para «pessoas de confiança» e que, «no caso de ser reenviado», não deveria revelar o remetente original.
Mas a história segue
No dia 6, outro jornal da oposição, El Mundo, publicava também na primeira página a mesma sondagem, agora com outros «autores». O escândalo foi tão medonho que o dono do diário mandou recolher a edição e lançar outra com um encabeçado totalmente diferente. A primeira «noticiava» a derrota do «Não» por 51 contra 43 e a segunda, a oito colunas, eram tão inócua como «Mobilizações animam a rua». Da original ficaram alguns exemplares para a história e já estão na internet ( www.rnv.gov.ve ).
Brincar com os números é certamente grave, mas o mais grave é que a oposição venezuelana não dá qualquer sinal de aceitar um resultado desfavorável e continuar a pensar numa aventura golpista.