O Iraque e o Vietname

Albano Nunes

preço terá ainda o povo iraquiano que pagar para pôr fim à ocupação

Comparar o Iraque ao Vietname faz realmente sentido. Mesmo considerando que à luz de critérios de análise marxista existem profundas diferenças de situação. No Iraque falta uma força nacional aglutinadora conseqüentemente anti-imperialista, que na pátria de Ho Chi Minh foi o Partido Comunista. Falta uma perspectiva revolucionária, um projecto de sociedade, que dê todo o sentido à luta de libertação nacional, projecto que no Vietname era o socialismo já em construção na parte norte do país. Falta à resistência a rectaguarda segura e o apoio material, político e diplomático, que a URSS e o campo dos países socialistas representaram para o Vietname.

Mas mesmo assim a comparação justifica-se. Pela amplitude e coragem da resistência popular. Pela violência dos combates e as criminosas operações de terra queimada praticadas pelas forças de ocupação. Pelas brechas que se abrem no campo colaboracionista. Pelo atoleiro em que o Iraque está a transformar-se para os EUA. Como no Vietnam o que se anuncia um ano após a invasão é uma insensata escalada na guerra, com o envio de mais tropas, operações de retaliação de grande envergadura, novos e ainda mais monstruosos crimes contra o povo iraquiano como está a acontecer em Falluja. Para conquistar a sua Libertação do imperialismo americano o Vietname necessitou de quinze anos de luta duríssima e tiveram de tombar nada menos de 3 milhões de vietnamitas. Que preço terá ainda o povo iraquiano que pagar para pôr fim à ocupação da sua pátria milenária?

É urgente agir para atar as mãos do imperialismo norte-americano e impedir que se consume no Iraque uma tragédia da dimensão da tragédia vietnamita.
É necessário continuar a apontar o dedo acusador ao governo de Durão Barroso e a exigir que cesse o envolvimento do nosso país nesta guerra injusta. E a alertar para os riscos que correm os soldados da GNR no Iraque, tornados carne para canhão dos sórdidos interesses do imperialismo norte-americano, combatendo com firmeza novos actos de servilismo perante a estratégia agressiva do imperialismo.
É necessário desmascarar os projectos, em acelerado processo de realização, visando simultaneamente reforçar a ocupação e dar-lhe uma aparência de «legalidade» internacional. Ou seja, fazer avançar para o Iraque mais tropas e de mais países, fazer mesmo avançar a NATO (que sob comando da Alemanha já está no Afeganistão), tudo isto com a cobertura do Conselho de Segurança da ONU através de uma nova resolução que «reconheça» um governo fantoche «iraquiano», que por sua vez «solicite» às forças de ocupação «ajuda» para a «estabilização democrática» do país. Precisamente o que preconizam argutos analistas como o Gn. L. dos S.: «é preciso acelerar a passagem para a ONU da tutela política de todo o processo, com um mandato para uma força multilateral, sob comando americano» (Público,10.04.04). É importante desmontar esta cínica operação de socorro ao imperialismo americano e que, perante o crescente clamor internacional contra a guerra, visa facilitar velhos e novos envolvimentos de outros países no teatro de operações, tal como os EUA desesperadamente reclamam. A este respeito será particularmente significativa a posição que o governo espanhol de Zapatero vier em definitivo a adoptar.

É necessário prosseguir por todos os meios ao nosso alcance a luta contra a guerra e desenvolver activa solidariedade com a resistência patriótica do povo iraquiano. Tal como no Vietname também no Iraque a luta libertadora assume formas muito agudas, com um povo que não se resigna à opressão estrangeira, impondo às forças de ocupação reveses políticos e militares que suscitam admiração, simpatia e solidariedade por todo o mundo. Tal como no Vietname a força da solidariedade internacional e internacionalista é indispensável para por fim à guerra e derrotar o imperialismo.


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