Caminhos da Carris

Os trabalhadores da Carris travam, de há meses para cá, uma heróica luta, que a todos nós diz respeito e que constitui estímulo e incentivo, neste tempo político, marcado pela resistência à violentíssima ofensiva de classe do patronato e do Governo.
A Carris assegura, há mais de 130 anos, um serviço público determinante para a mobilidade e a economia e com enormes reflexos na qualidade de vida dos que vivem e trabalham em Lisboa.
As opções políticas que vêm sendo tomadas por sucessivos governos do PSD e do PS, sempre com o apoio do CDS-PP, prejudicam profundamente a cidade de Lisboa. Constantes cortes na oferta, alterações de percursos e frequências e encurtamento de carreiras resultaram no inadmissível aumento do período de espera dos utentes e conduziram ao isolamento a que cada vez mais zonas da cidade e da periferia estão sujeitas, a partir de determinadas horas e de modo agravado aos fins-de-semana.
Como consequência, num período de 3 anos, 26 milhões de passageiros – o equivalente a cerca de 40 mil pessoas – foram empurrados para o transporte individual.
Passámos recentemente a ser confrontados com o anúncio de uma falsa reestruturação, apoiando-se no velho argumento das dificuldades financeiras da empresa e no baixo custo dos bilhetes e passes sociais.
A verdade é outra, e bem diferente.

Custos, problemas
e «reestruturação»


O incumprimento, por diferentes governos, das obrigações de dotar a empresa dos meios necessários ao seu funcionamento, nomeadamente com as indemnizações compensatórias devidas pelo serviço público prestado, é responsável pelos problemas financeiros com que a Carris se defronta, conforme é reconhecido no Relatório, de Julho de 2002, da Comissão de Análise às Contas Públicas. Só na década de noventa, o Estado ficou em dívida para com a Carris no valor de qualquer coisa como 424 milhões de euros.
Como se isto não bastasse, a Carris e as restantes empresas públicas de transportes são espoliadas em muitos milhões de euros a favor das empresas privadas de passageiros (o Grupo Barraqueiro é o principal beneficiado): só na repartição das receitas do Passe Social, e apenas no período de 1997 a 2000, mais de 20 milhões de euros, conforme o Tribunal de Contas reconheceu num relatório de 2001.
Mas vejamos em que se traduz, afinal, o pretenso programa de reestruturação:
- Mais uma brutal redução na oferta, que todos vamos já sentindo;
- Alienação de património para a especulação imobiliária;
- Ataques aos direitos dos trabalhadores;
- Destruição de postos de trabalho, apoiada em repressão e pressão ilegítimas da empresa, através de um plano de «rescisões amigáveis».
O Governo do PSD/CDS-PP e o CA da Carris, com a cobertura do presidente da Câmara de Lisboa, argumentam falaciosamente com a municipalização, como o caminho para a resolução dos problemas com que a Carris se defronta.
Mas em Otava, em Junho, em resposta ao presidente da Bombardier, o primeiro-ministro assumiu que a privatização se pode dar após a Carris passar para a tutela da CML. (O Independente, 11/06/2003). Fica tudo mais claro sobre as reais intenções do Governo.
Se dúvidas houvesse, elas desfaziam-se perante o conteúdo do Programa do Governo PSD/CDS-PP, reafirmado nas Grandes Opções do Plano para 2004, onde se defende claramente «a abertura à iniciativa privada das empresas actualmente detidas pelo Estado ou nas quais o Estado e outras entidades públicas detenham, directa ou indirectamente, a maioria do capital social».
É elementar colocar algumas perguntas.
O que se pretende municipalizar? O todo da empresa ou partes? Quais destas são para municipalizar? Que destino terão as restantes? E os direitos dos trabalhadores? E o seu património? E a enorme dívida que o Estado tem para com a empresa, como é resolvida.
Serão necessárias alterações na posse do capital social da Carris, para que sejam criados mais corredores BUS, para que seja prestado às populações o serviço de que precisam e a que têm direito?
Claro que não. O que é preciso é que haja vontade política para tal.
Só a firmeza e determinação dos trabalhadores levou a que o CA finalmente entregasse o chamado Programa de Reestruturação e se decidisse a sentar-se à mesa para discutir.
Os trabalhadores da Carris, com a sua luta, afirmam que, hoje como no passado, é na luta e unidade, em convergência com os utentes, que está o caminho seguro para a defesa dos seus interesses de classe e o futuro da empresa.

CL


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