«Donos do Natal»

Ângelo Alves

Estas palavras são também para todos o que resistem e dão esperança ao mundo

Após uma quadra festiva mais uma vez marcada pelo consumismo desenfreado, pelo marketing hiper agressivo, pela «obrigatoriedade» da compra de um interminável rol de «artigos obrigatórios» para a época, aqui está o novo ano.
Pelo caminho ficaram aqueles que não puderam comprar «aquelas» prendas ou que não puderam ter «aquela» passagem de ano. Chamemos-lhes «excluídos do natal». Estes são muitos dos que se convencionou apelidar de «excluídos sociais». Mas os «excluídos do natal» são também – e cada vez mais – os «incluídos socialmente» que conseguem a muito custo e sofrendo uma intensa exploração sobreviver na linha de água do mar de pobreza que alastra e afoga milhares de milhões de seres humanos em todo o planeta.
Simultaneamente sabemos que existem os que enriquecem e investem cada vez mais e que, apesar da dita crise, viram os seus negócios garantir taxas de lucro e resultados financeiros anuais que qualquer um de nós jamais sonharia vir a acumular durante uma vida. Chamemos-lhes os «donos do natal»
É exactamente nesta altura que os «donos do Natal» se lembram de falar dos e aos «excluídos do Natal». Tentando dar uma imagem humana ao sistema inumano que promovem e dirigem, realizam um significativo cortejo de «caridadezinhas» tentando assim ocultar as suas culpas e mostrar o seu «bom coração».

Mas se nos países ditos ricos assistimos a manobras de «inclusão natalícia» para ocultar o evidente, no resto do mundo vive uma imensidão de seres humanos que nem a caridade dos «donos do natal» sente. É para esses que vão estas primeiras palavras do ano: para todos os excluídos do Natal e dos brindes ao novo ano; para aqueles que resistem à barbárie do capitalismo muitas vezes lutando pura e simplesmente pela sobrevivência; para aqueles milhares de milhões de seres humanos que não têm dinheiro para comprar um alimento mais especial; que não têm sequer que comer; que se viram privados dos seus empregos ou que não têm sequer água para beber ou casa para morar.

E estas palavras vão ainda muito especialmente para aqueles que no Irão, na cidade de Bam, viram perder os seus familiares e amigos no violento sismo que destruiu por completo a cidade e matou cerca de 30 000 pessoas. Este caso deve-nos fazer reflectir... Se nos países ditos ricos, por exemplo nos EUA, um sismo de intensidade comparável provoca um número limitado de vítimas mortais, já no Irão ou noutros países ditos pobres o número de vítimas dispara cada vez que ocorre uma catástrofe natural. É sinal de que até nos efeitos das catástrofes naturais e epidemias o sistema divide e exclui. Assim o foi neste caso do Irão. É-o igualmente nas vagas de frio na Índia; na questão da SIDA no continente Africano; nas doenças evitáveis que continuam a matar dezenas de milhar de crianças por dia, etc.

Mas se há exploração e exclusão também há luta e esperança. E essa tem-se feito sentir intensamente durante o ano que passou. E irá continuar!
Portanto, estas palavras são também para todos o que resistem e dão esperança ao mundo novo que virá e que estão no Iraque, Palestina e Afeganistão, resistindo às ocupações imperialista e sionista mas que estão também e pelas mais variadas razões na Jugoslávia, em África, nos EUA, na Europa, na Índia, no Brasil, na Venezuela, enfim, por todo o mundo. Esses, como nós, não desejam a caridade dos «donos do natal». Desejam e vão prosseguir na senda de um corte radical com este sistema que explora, exclui, reprime e mata.
Falando de esperança, uma palavra final especial para a nação cubana, o seu povo e o Partido Comunista de Cuba que comemoraram nesta passagem de ano o 45.º aniversário da sua revolução socialista.
Tal como eles seguiremos adiante, em luta, para que todos possamos um dia ter um Natal e um novo ano que de todos será.


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