Descubra as diferenças

Jorge Pires (Membro da Comissão Política do PCP)
Se dúvidas ainda existissem sobre a importância crescente que os media vêm a assumir na sociedade portuguesa, quer na forma como os portugueses lêem acontecimentos e agem perante as notícias, quer na intervenção directa na luta pelas ideias, os dias que correm encarregam-se de as dissipar.

Os media assumem em muitos momentos uma postura de deturpadores

Hoje, mais do que nunca, é fundamental o entendimento de que os meios de comunicação e os próprios jornalistas, não são marginais à sociedade em que estão inseridos, intervêm e procuram com a sua intervenção influenciar a evolução dessa sociedade. Nas sociedades capitalistas, como a nossa, os grandes meios de comunicação ou são propriedade de grandes grupos económicos, como é o caso da grande maioria, ou são controlados pelo poder político instalado no Governo, mas ambos têm em comum, reflectirem claramente os interesses de quem os controla, procurando sobretudo garantir a continuação da ordem económica, política e social instaladas.
É neste quadro de avaliação, sobre o que são e representam a generalidade dos grandes meios de comunicação em Portugal, que temos de entender o que se tem passado em Portugal nas últimas semanas, no plano da informação.
Quem procura informar-se sobre a realidade do País, apenas na leitura dos jornais ou no visionamento dos telejornais, ficará com uma noção profundamente redutora da realidade e, certamente, muitos nem se aperceberão que estamos perante uma enorme operação de distracção da opinião pública dos mais importantes problemas do País, operação sustentada na super valorização do acessório, em detrimento daquilo que é essencial.
É neste mundo das noticias, cujo conteúdo dos grandes meios de comunicação social é determinado por «critérios jornalísticos» não coincidentes no fundamental com os interesses da esmagadora maioria dos portugueses e do País, que devemos procurar entender as razões pela qual se procura distrair as atenções dos portugueses, dedicando páginas inteiras de jornais e horas dos noticiários às questões da pedofilia e a outras a ela associadas, como o problema das escutas telefónicas, ou ao diz que disse de ministros e secretários de estado, ou ainda quando um canal televisivo ocupa a antena durante doze horas a falar da inauguração de um estádio de futebol, para já não falar dos enfadonhos e desinteressantes artigos de opinião, dos chamados analistas políticos.
Não é que não seja importante falar destes acontecimentos, mas é preciso que os portugueses saibam que enquanto são entretidos com este tipo de notícias, esconde-se os gravíssimos problemas que o país real atravessa, nas causas e consequências desses problemas, e sobretudo não se faz a identificação das políticas que conduziram à situação com que hoje somos confrontados, com os responsáveis pela sua concretização.

Vir para a rua e esclarecer

Dão horas de tempo de antena ao Governo, sobretudo ao Sr. Primeiro-Ministro e à ministra das Finanças, para falarem numa retoma da economia, que ninguém sente, mas passa-se como gato pela brasa sobre o relatório, insuspeito, da Direcção Geral de Economia e Finanças da Comissão Europeia, que considera Portugal, como o país da UE que tem o pior nível de vida, admitindo mesmo que em 2005 este venha a ser idêntico ao de 1992.
Mostram a correria dos membros do Governo pelo País fora, apresentando projectos de desenvolvimento, mas escamoteia-se um principio fundamental, de que não é possível desenvolver um país, apostando apenas de forma redutora no crescimento do PIB (produto interno bruto), que sendo importante, é insuficiente, se não for acompanhado de medidas sociais, nas áreas da educação, da saúde e da segurança social, entre outras. Enchem-se páginas de jornais sobre a necessidade de modernizar a nossa economia, como factor decisivo para aumentar a produtividade e a competitividade das nossas empresas, e esconde-se que qualquer modelo económico assente nos baixos salários e na limitação de direitos é ele próprio um obstáculo ao crescimento económico.
Valorizam a dissertação de ministros e secretários de Estado, que vão às televisões falar sobre as preocupações que cinicamente dizem ter com os pobres e os desprotegidos da nossa sociedade, apontando a caridade como solução, mas não se dá voz aos mais de 400 mil desempregados inscritos no IEFP, ou aqueles que vão engrossando o número dos que vivem no limiar da pobreza e aos excluídos da sociedade
Ao contrário de cumprirem uma das suas funções principais, que é informar e formar, os media assumem hoje em muitos momentos, uma postura de deturpadores dos factos, com o objectivo de criarem uma falsa realidade do País, condicionando desta forma opiniões e comportamentos para assim procurarem empurrar os portugueses para o conformismo e a passividade.
A nós comunistas, cabe-nos a importante tarefa de ir para a rua e esclarecer, valorizando um importante instrumento para esse esclarecimento que é o Avante!, contribuindo desta forma para que os portugueses tenham uma noção exacta da realidade objectiva, mas também consigam separar aquilo que é essencial do que é acessório, momento decisivo para a opção de cada um participar ou não, no movimento mais global de transformação da realidade em que vivemos, que neste momento passa por interromper esta política e substituir este Governo, desígnio que mobiliza já hoje muitos portugueses.


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