Clarificações

Leandro Martins
Afinal, só por cá é que as coisas andam turvas. Com a chegada das primeiras brumas, parece que, como na história da manta curta, se destapa o céu no resto do mundo. É que, por cá, pouca informação real nos chega da realidade. No resto do mundo, porém, as coisas clarificam-se, desvendam-se. Não falamos propriamente de anúncios de casamentos reais em Espanha, mas daquelas coisas que são realmente importantes para o mundo.
Por exemplo: Andreotti, o antigo primeiro ministro italiano, condenado há um ano por cumplicidade no assassínio de um jornalista, por um júri de seis cidadãos e dois magistrados que o mandaram para a cadeia por 24 anos, foi finalmente (!) ilibado, absolvido, pelo Supremo Tribunal daquela que é conhecida por república de juizes. Afinal não havia nem provas nem motivação... nem máfia. Berlusconi esfrega as mãos de contente, chocalhando o relógio que terá comprado na China, onde o seu ministro Frattini, que o acompanhou na visita oficial em que terá conversado sobre as contrafacções a marcas de qualidade, foi «apanhado», segundo a Lusa, a comprar uma falsificação de um relógio de marca. E talvez se prepare no parlamento uma recepção calorosa a Andreotti, com abraços e beijos ao absolvido político.
Na Rússia, onde Putin enfiou na prisão o milionário Khodorkhovski por suspeita de fraude e evasão fiscal, este também clarificou as coisas, demitindo-se da presidência da Iukos, o que fez as acções da monstruosa companhia subir de novo na praça. E, para que a clarificação fosse maior, o chefe da empresa é agora um... americano.
Por falar em americanos, também daí vêm clarificações. No congresso, os democratas acusam agora Bush de lhes ter mentido ao dar como pretexto da guerra a «existência» de armas de destruição maciça. Coitados, acreditaram... E o seu candidato aconselha o presidente a pedir ajuda aos aliados. É que a guerra anda a custar caro, milhares de milhões de dólares. E não pára, segundo pouco divulgadas notícias. As tropas continuam entrincheiradas no Iraque, mas já não são as de Saddam, são as da «coligação», que regista 15(!) ataques por dia, por parte de forças «articuladas» de guerrilheiros e mais de 150 mortos desde que a «paz» se instalou.
Mas Bush assegurou, «clarificando», que não fugirá. Pode estar descansado. A ajuda parte dentro de momentos. Com a bênção de Belém, os portugueses vão resolver a situação.


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