A vitória da confiança
O 15 de Fevereiro passará à história como a data de uma das mais maciças, amplas e combativas jornadas de luta pela paz, quando milhões de pessoas se lançaram simultaneamente à rua, na Europa e um pouco por todo o mundo, afirmando a sua determinação em impedir a guerra.
Sim, a guerra não é inevitável. As classes dominantes não poderão deixar de ouvir um clamor que ultrapassou todas as expectativas. Mas é evidente que os perigos subsistem e se tornam mesmo cada dia mais sérios. Prosseguem os preparativos materiais e psicológicos da agressão, agora no Iraque, depois contra a Síria, o Irão ou a R.D.P. da Coreia, como anunciam com incrível cinismo altos responsáveis norte-americanos. Na NATO, Bush e Blair ultrapassaram obstáculos fundamentais na questão da Turquia. O «compromisso» a que chegou a Cimeira da União Europeia indicia um inquietante recuo diante dos propósitos hegemónicos dos EUA.
É por isso necessário persistir com determinação na luta. A hora continua a ser a da mais ampla unidade e convergência possível contra a guerra. De todos os que, pelas mais diversas razões, estão contra a insuportável arrogância do imperialismo norte-americano. Mesmo se sobre as causas dos gravíssimos perigos que espreitam há posições muito diferentes. Mesmo se entre todos os que se inquietam e mobilizam há muitos que, se a ONU viesse dar cobertura à guerra, seriam levados a considerar que por esse simples facto a sua natureza teria mudado, esquecendo que o móbil do crime é o petróleo, são os interesses dos grandes grupos económicos, são os desígnios estratégicos de domínio mundial dos EUA. Mesmo se ao extraordinário movimento popular se colam inevitavelmente correntes e personalidades movidos pela ânsia de protagonismo ou tentando impedir a sua radicalização anti-imperialista.
A grande manifestação de Lisboa e outras realizadas noutros pontos do país mostram que cresce a consciência de que a guerra anunciada, não é algo de distante, diz directamente respeito aos portugueses. Diz respeito às nossas vidas e ao futuro dos nossos filhos. Diz respeito à nossa democracia e à independência de Portugal. O combate contra a direita e contra a guerra entrelaçam-se mais claramente perante a vergonhosa política de submissão do Governo do PSD - CDS / PP ao imperialismo norte-americano. Algo de semelhante se passará noutros países. Além de que a sua dimensão internacional e internacionalista dá mais ânimo à luta de todos e de cada um, dá mais força à convicção de que vale a pena lutar e de que é possível vencer.
A luta contra a guerra adquiriu uma tal expressão de massas e dimensão internacional que se está a tornar num actor incontornável do desenvolvimento mundial. Se conseguirá ou não impedir a guerra contra o Iraque é o que veremos. Uma coisa é certa: se a guerra for desencadeada, fautores e comparsas serão responsabilizados e pagarão caro o seu desprezo pela vontade popular.
«Si, se puede»
Entretanto há já a assinalar aquela que porventura é a maior de todas as vitórias : a da confiança no resultado da luta. A pretexto das derrotas do socialismo tentaram lavar-nos o cérebro e roubar-nos a esperança. Com o seu poderoso dispositivo ideológico e mediático, o grande capital procurou reescrever a História à medida dos seus interesses e levar os trabalhadores e os povos a interiorizarem as teses do «fim da história» e com elas a descrença na organização, na resistência e na luta. Na sequência de muitas outras, as gigantescas manifestações do dia 15 aí estão a atestar uma crescente rotura das massas com a ideologia desmobilizadora do «pensamento único». Sim, é possível! Sim, é possível impedir a guerra! Sim, um outro mundo, socialista, é possível.
Esta é a hora da mais ampla unidade. Mas é também a hora de lembrar que esta extraordinária resistência que hoje se levanta contra a guerra (e a globalização capitalista em geral) se tornou possível porque, mesmo nos momentos mais duros, quando uma pesada cortina de anticomunismo quase fechava o horizonte de uma vida melhor, houve quem ousasse remar contra a corrente, se não submetesse, não deixasse de acreditar, de resistir e de lutar. Em Cuba, como em Timor-Leste, na Palestina como em Portugal e por todo o mundo. Um dia se avaliará melhor o que neste processo representou o corajoso e digno «si, se puede» cubano, ou a serena e convicta confirmação da identidade comunista do PCP e a sua determinação em prosseguir a luta.
Como um dia se avaliará melhor o que realmente representa este movimento sem precedentes contra a guerra, esta extraordinária «globalização da solidariedade», e a sua contribuição à luta para impedir o imperialismo de impor ao mundo uma «nova ordem mundial» totalitária, contra os trabalhadores e contra os povos.