O conflito congolês e a hipocrisia europeia

Carlos Lopes Pereira

A primeira-ministra da República Democrática do Congo (RDC), Judith Suminwa, denunciou a existência de milhares de mortos, feridos e deslocados causados pelo conflito armado no leste do país.

Intervindo na 58.ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, a governante congolesa reclamou a aplicação de medidas dissuasoras para pôr fim aos massacres cometidos pelas tropas do Movimento 23 de Março (M23) apoiadas por forças armadas do Ruanda.

Segundo as Nações Unidas, cerca de 27 milhões de pessoas na zona necessitam de assistência humanitária, entre elas quase três milhões de deslocados internos. Além da falta de abrigos, alimentos e água potável, há o perigo do alastramento de doenças infeciosas como a cólera e o mpox.

No plano político e diplomático, o Conselho de Segurança da ONU aprovou na semana passada, por unanimidade, uma resolução que condena «energicamente» a ofensiva militar em curso e os avanços das forças do M23 e ruandesas nas províncias de Kivu Norte e Kivu Sul, apesar da presença da missão da ONU (Monusco) e de um contingente sul-africano. A resolução pede o cessar «imediato e incondicional» das hostilidades e a retirada das tropas invasoras das cidades de Goma e Bukavu, capitais regionais, e de todas as zonas ocupadas ilegalmente, bem como o desmantelamento das administrações paralelas ilegítimas estabelecidas na RDC.

O Conselho de Segurança instou as forças do Ruanda a cessar o apoio ao M23 e a retirar-se imediatamente do território congolês. Condenou os ataques contra populações e infra-estruturas civis, as execuções sumárias, a violência sexual e o recrutamento de menores. E exortou Kinshasa e Kigali a regressar, sem condições prévias, às negociações diplomáticas com carácter de urgência para conseguir uma solução duradoura e pacífica do prolongado conflito na região.

No quadro da União Africana, também há esforços para calar as armas no leste da RDC. Depois do fracasso dos processos de Luanda e de Nairobi (com Angola e o Quénia a procurar, sem êxito, aproximar as posições da RDC e do Ruanda, contra a vontade dos respectivos chefes de Estado, o congolês Félix Tshisekedi e o ruandês Paul Kagame), a intermediação foi entregue a duas organizações regionais, a Comunidade da África Oriental (CAO) e a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC).

Foi agora anunciado que, neste contexto, três «sábios africanos» – os ex-presidentes do Quénia, Uhuru Kenyatta, e da Nigéria, Olusegun Obasanjo, e o ex-primeiro-ministro da Etiópia, Hailemariam Desalegn Boshe – foram designados «facilitadores» do processo de paz na RDC. Terão a tarefa, difícil, de coordenar os esforços diplomáticos e de segurança até a um cessar-fogo duradouro.

Perante o agravamento da crise na RDC, os Estados Unidos da América anunciaram sanções a dirigentes ruandeses e do M23 e a União Europeia insinuou que pode «suspender» a cooperação militar com o Ruanda. Tudo isso, como denunciou recentemente o Novo Jornal, de Luanda, «expõe a hipocrisia europeia»: desde há anos que está provado que o Ruanda promove, no leste congolês, a extracção ilegal de minérios estratégicos, como coltão e cobalto, além de «terras raras», que em seguida exporta para o Ocidente, «incluindo as potências industriais europeias».

 



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