50 anos da Conferência de Helsínquia – luta pela paz e pelo ambiente

Vladimiro Vale (Membro do Secretariado e da Comissão Política)

Helsínquia só foi possível pela existência de uma correlação de forças favorável à Paz


No rescaldo da realização da grandiosa manifestação pela Paz em Lisboa, e num quadro em que são evidentes perigosos desenvolvimentos, nomeadamente com a escalada de confrontação e guerra do imperialismo, vale a pena lembrar a Acta Final da Declaração de Helsínquia. Portugal participou oficialmente na última fase dos trabalhos desta Conferência, em Agosto de 1975, sendo que o Acto Final foi assinado pelo Presidente da República, General Costa Gomes.

Neste acto, pela primeira vez, conseguiu-se reunir esforços para que 33 países europeus, EUA e Canadá chegassem a acordo acerca de princípios reguladores das relações internacionais, da segurança colectiva e do desenvolvimento de relações de cooperação entre Estados europeus, que se comprometeram a respeitar a igualdade soberana, o não recurso à ameaça e ao uso da força, a resolução pacífica dos conflitos, a não intervenção nas questões internas, o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais, a igualdade de direitos, a autodeterminação dos povos e a cooperação entre Estados. Princípios que a luta do povo português veio a consagrar na Constituição da República Portuguesa, nomeadamente no artigo 7.º.

O carácter avançado do documento é evidente em numerosos aspectos. Destaco, pela actualidade, a abordagem às questões ambientais, a que Acta Final dedica todo o ponto 5 e em que os Estados participantes afirmam que «a protecção e o melhoramento do meio ambiente, bem como a protecção dos seus recursos em benefício das gerações presentes e futuras, constituem uma das tarefas de maior importância para o bem-estar dos povos e para o desenvolvimento económico de todos os países e que muitos dos problemas relativos ao meio ambiente, em particular na Europa só podem ser resolvidos de maneira eficaz através de uma estreita cooperação internacional». O documento vinca a necessidade de ampliação da concepção multidisciplinar dos problemas ambientais, da harmonização de métodos de recolha e análise de dados e de monitorização de parâmetros ambientais e desenvolve ainda aspectos da luta contra a poluição atmosférica, salvaguarda de reservas hídricas, protecção do ambiente marítimo, conservação da Natureza e qualidade ambiental das zonas de habitação humana.

Numa linha surpreendentemente actual, o texto aponta ainda a necessidade de «investigação básica, vigilância, previsão e avaliação das alterações do meio ambiente. Estudo das modificações climáticas, da paisagem e do equilíbrio ecológico devidas tanto a factores naturais como à acção do homem; previsão de possíveis mudanças genéticas na flora e fauna como consequência da poluição do meio ambiente; harmonização dos dados estatísticos, laboração de critérios científicos e de sistemas de redes de controlo, métodos normalizados de observação, medição e avaliação das transformações na biosfera; avaliação dos efeitos dos níveis de poluição do meio ambiente e da degradação do ambiente sobre a saúde humana; estudo e formulação de critérios e normas aplicáveis a diversos poluentes e regulamentação relativa à produção e utilização de diversos produtos».

A assinatura deste importante documento constituiu um dos acontecimentos mais importantes do pós-guerra, e só foi possível pela existência de uma correlação de forças favorável à Paz, num quadro de derrotas do imperialismo. Tudo isto reforça o apelo do PCP à constituição de uma ampla frente anti-imperialista que trave e faça recuar os intentos do imperialismo e abra caminho a uma nova ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos, mas também o apelo à luta em defesa da Natureza e do Ambiente, que é necessariamente uma luta contra a guerra e que implica a denúncia do imperialismo e do seu papel na corrida aos armamentos, assim como rejeição da promoção de uma «economia de guerra».

 



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