Água mole

Jorge Cordeiro

O sen­tido do muito po­pular di­tado sobre o que se es­pera de “água mole em pedra dura” está em vias de ser di­na­mi­tado pelo PS. Po­li­ti­ca­mente fa­lando, seja pela mo­leza das suas ati­tudes, seja pela bran­dura e con­des­cen­dência com as op­ções do Go­verno PSD/​CDS, o que a di­reita pode ter por certo e ga­ran­tido é que, com a água vinda da­quele lado, para lá de uns pingos in­có­modos ou ar­re­li­a­dores, não é dali que vem o risco de ver fu­rados os seus ob­jec­tivos de pros­se­guir o rumo de ex­plo­ração e in­jus­tiças.

Não é o muito es­bra­cejar ou um atirar de frases para o ar, mais ou menos al­tis­so­nantes, que in­co­mo­dará o ac­tual Go­verno, tanto mais quanto sabe que, do lado do PS, en­contra o con­forto de que ne­ces­sita sempre que de­cidir de ques­tões es­sen­ciais à gula e in­te­resses do grande ca­pital. Soa a falso, pior, atinge o li­miar do cho­cante ouvir o Se­cre­tário-Geral do PS acusar o PSD de go­vernar “para uma mi­noria” ou res­pon­sa­bi­lizar Luís Mon­te­negro de ser o “prin­cipal agente da ins­ta­bi­li­dade po­lí­tica em Por­tugal”.

Para quem, como o PS, acabou de ga­rantir o apoio e votos que as­se­gu­rarão a essa mi­noria de grupos eco­nó­micos um novo bodo, por via da re­dução do IRC, que lhes dará mais umas largas cen­tenas de mi­lhões de euros, a somar aos mi­lhares de mi­lhões que já hoje em­bolsam, bem se pode dizer que, pe­rante afir­ma­ções destas, mais avi­sado seria ficar ca­lado. So­brará apesar de tudo essa es­cla­re­ce­dora con­fissão de que, por parte do PS, os par­tidos do Go­verno – e já agora Chega e IL, dis­pen­sados de as­sumir o que de­fendem a partir da margem que a cum­pli­ci­dade so­ci­a­lista com a agenda ex­plo­ra­dora em curso lhes dá – podem pros­se­guir sem grande ins­ta­bi­li­dade os seus pro­jectos e op­ções.

E de pouco va­lerá que agora a nova di­recção do PS es­palhe aos quatro ventos a sua in­tenção de fazer uma “opo­sição dura” se ela se tra­duzir, como se vê, na­quela frou­xidão das “abs­ten­ções vi­o­lentas” que, pro­cla­madas há uma dé­cada, agora estão re­cu­pe­radas por in­teiro.



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