Água mole
O sentido do muito popular ditado sobre o que se espera de “água mole em pedra dura” está em vias de ser dinamitado pelo PS. Politicamente falando, seja pela moleza das suas atitudes, seja pela brandura e condescendência com as opções do Governo PSD/CDS, o que a direita pode ter por certo e garantido é que, com a água vinda daquele lado, para lá de uns pingos incómodos ou arreliadores, não é dali que vem o risco de ver furados os seus objectivos de prosseguir o rumo de exploração e injustiças.
Não é o muito esbracejar ou um atirar de frases para o ar, mais ou menos altissonantes, que incomodará o actual Governo, tanto mais quanto sabe que, do lado do PS, encontra o conforto de que necessita sempre que decidir de questões essenciais à gula e interesses do grande capital. Soa a falso, pior, atinge o limiar do chocante ouvir o Secretário-Geral do PS acusar o PSD de governar “para uma minoria” ou responsabilizar Luís Montenegro de ser o “principal agente da instabilidade política em Portugal”.
Para quem, como o PS, acabou de garantir o apoio e votos que assegurarão a essa minoria de grupos económicos um novo bodo, por via da redução do IRC, que lhes dará mais umas largas centenas de milhões de euros, a somar aos milhares de milhões que já hoje embolsam, bem se pode dizer que, perante afirmações destas, mais avisado seria ficar calado. Sobrará apesar de tudo essa esclarecedora confissão de que, por parte do PS, os partidos do Governo – e já agora Chega e IL, dispensados de assumir o que defendem a partir da margem que a cumplicidade socialista com a agenda exploradora em curso lhes dá – podem prosseguir sem grande instabilidade os seus projectos e opções.
E de pouco valerá que agora a nova direcção do PS espalhe aos quatro ventos a sua intenção de fazer uma “oposição dura” se ela se traduzir, como se vê, naquela frouxidão das “abstenções violentas” que, proclamadas há uma década, agora estão recuperadas por inteiro.