A operação revanchista e os alinhamentos reveladores
A operação montada a propósito do 25 de Novembro, culminando com a sessão na Assembleia da República na passada segunda-feira, foi acompanhada de empenhados contributos na esfera mediática. A data não é redonda, tão pouco surgiram elementos novos sobre a data que não seja o revigorar dos sectores mais revanchistas e inconformados com Abril, com as imensas comemorações populares do seu 50.º aniversário e com as marcas que perduram no nosso País desse extraordinário processo transformador.
A verdade é que o empenho com que tantos órgãos de comunicação social dedicaram à data nas últimas semanas é mais uma demonstração de alinhamento de agendas entre as forças políticas mais retrógradas e reaccionárias (com infelizes contributos de sectores ditos de esquerda, que deram aval à manobra) e os decisores mediáticos.
Falemos de uma versão sobre os acontecimentos de 25 de Novembro de 1975, publicada como verdade histórica pelo semanário Expresso, envolvendo o PCP. Quando se lêem as muitas páginas dedicadas ao tema na última edição do jornal, percebe-se que toda a história se sustenta num documento que não se conhece, envolvendo duas pessoas já falecidas. Não precisamos de ir às práticas científicas que sustentam o labor de historiador: as regras elementares do jornalismo revelaram-se (de novo) um incómodo para o Expresso. Como a peça tinha de ser publicada, a solução do Expresso (de novo) foi deitar ao lixo as regras da profissão. Há dias em que a máxima, por aquelas bandas, parece ser “nunca deixes o rigor prejudicar uma boa história”.
Da imprensa escrita para a televisão, as opções incompreensíveis também não faltaram. Após semanas de questionamentos insistentes sobre a posição do PCP sobre a sessão parlamentar, nomeadamente sobre a participação dos deputados comunistas, o Secretário-Geral anunciou-a na semana passada. Espantosamente, feito o anúncio, este foi coberto por um manto de silêncio: entre as televisões, só a RTP fez brevíssima notícia, sem qualquer passagem das declarações ou imagem do Secretário-Geral do PCP. Ao mesmo tempo que as posições do PCP são silenciadas, em especial com o apagamento das declarações de viva voz, é dado amplo espaço ao autêntico desfile de comentadores (um mar no qual encontrar um comunista é como encontrar uma agulha num palheiro) para discorrer sobre essas mesmas posições.
No plano mediático, esta operação em torno do 25 de Novembro saldou-se em mais uma derrota para a integridade do jornalismo e para o rigor e pluralidade na comunicação social. É sobre este pano de fundo que se desenrola a verdadeira crise da comunicação social, a que se somam episódios preocupantes para todos quantos valorizam a liberdade, também nas redacções: depois do ataque anunciado pelo Governo (com programa de despedimentos incluído), a administração do Público (da Sonae) proibiu reuniões sindicais nas instalações do jornal e já se fala num despedimento colectivo em preparação. É isto a liberdade de imprensa quando se a coloca nas mãos dos grupos económicos.