«Flexisegurança» outra vez!

Ricardo Costa (Membro da Comissão Política)

O que resta a quem vive com cerca de 700 euros por mês?

LUSA

Salários, horários, vínculo, precariedade, contratação colectiva, direitos. Todos estes elementos são factor de confronto entre trabalho e capital. Se, por um lado, a luta dos trabalhadores procura avançar em cada um destes elementos, não é menos verdade que o capital usa cada um deles para chantagear os trabalhadores, procurando condicionar a sua tomada de posição na luta, uma luta com objectivos opostos aos interesses dos que promovem a exploração.

Perante dificuldades crescentes, com o custo de vida sobre bens de primeira necessidade a aumentar, a que se soma o brutal impacto do custo com a habitação, milhares de trabalhadores são forçados a um exercício de sobrevivência: pago a renda ou compro comida? Qual a conta que deixarei para acumular para o próximo mês? A da água? A da luz ou do gás? Os baixos salários praticados servem hoje, como no passado, como elemento de condicionamento e chantagem. Não é por acaso que o patronato mostra a sua «disponibilidade» para a distribuição de prémios (realidade já existente em muitas empresas), mas não aceita que esse valor integre o salário por saber que, fazendo-o, já não o pode retirar.

Ora, o que resta a quem vive com cerca de 700 euros por mês? Sobreviver, mas não só. O que temos assistido nos últimos meses é a uma importante resposta dos trabalhadores nas diversas acções de luta que se têm vindo a realizar, pela melhoria das suas condições de vida, nomeadamente pelo aumento dos salários, mas também pelo emprego estável e por horários dignos, luta que tem sido arredada das televisões.

Sabemos que há factores de grande desequilíbrio nos locais de trabalho, que condicionam muito a vida de quem trabalha. A precariedade é um factor de profunda instabilidade na vida de milhares de trabalhadores e anda sempre de braço dado com os baixos salários. A desregulação dos horários de trabalho e o alargamento do período normal de trabalho são factores que o patronato tem usado como arma de chantagem nas empresas e locais de trabalho, alterando constantemente os horários ou desrespeitando o direito a conhecer atempadamente qual o horário de trabalho para o dia ou para a semana seguintes. Por outro lado, procuram introduzir mecanismos como o «banco de horas», que mais não é do que trabalho suplementar não pago.

Resistência e luta
Apesar das múltiplas ofensivas nos locais de trabalho, os trabalhadores lutam, resistem, afirmam direitos e rejeitam ataques. E o capital, bem como os que estão ao seu serviço, não gostam desta resistência.

É por isso que é preciso alertar todos os que vivem do seu trabalho que devem manter os olhos bem abertos, mesmo numa altura do ano em que quem trabalha terá o seu merecido descanso.

Porque o Governo PSD/CDS diz claramente no seu programa ao que vem. Se dúvidas houvesse, a própria ministra do Trabalho já afirmou várias vezes que é sua intenção rever a legislação laboral. O objectivo é claro e a repetida expressão «flexibilidade», utilizada ao longo do programa do Governo quando se refere ao trabalho, faz lembrar outras, em tempos não muito longínquos, como a «Flexisegurança», termo infeliz usado para designar uma tal aliança entre flexibilidade e segurança. Na prática, o que procuravam era mais precariedade, mais desregulação de horários, menos salário para quem trabalha, mais lucros para o capital, facilitação dos despedimentos. Hoje, procuram retomar e aprofundar esse caminho.

Cá estaremos para responder a cada ataque, a cada ofensiva. É preciso mexer na legislação laboral, sim, mas não para desregular mais a vida dos trabalhadores e das suas famílias. O que é urgente é revogar todas as normas que atacam os trabalhadores e que dão ao patronato as armas para explorar, reprimir e oprimir quem produz a riqueza no País.

Cá estaremos para dar combate à exploração, com a certeza de que apesar das leis, o que determina é a força e a luta de quem trabalha, e os trabalhadores sabem que contam com o PCP nessa luta.

 



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