Os caniches dos EUA
O gabinete de segurança de Israel apresentou há dias alterações à legislação que permite o encerramento dos meios de comunicação social estrangeiros que alegadamente prejudicam a defesa do Estado, prolongando-o para além da situação de guerra, bem como a requisição das respectivas instalações por decisão do Ministério da Segurança Nacional.
Na mira estará de imediato a cadeia televisiva Al Jazeera, do Qatar, alvo sistemático de críticas por parte do Ministério das Comunicações pela cobertura que faz das atrocidades israelitas em Gaza e na Cisjordânia.
A medida censória israelita não suscitou críticas internacionais nem mereceu a atenção dos media corporativos, talvez por a UE fazer o mesmo a órgãos russos e iranianos, por exemplo. Já a decisão da Rússia de proibir a actividade da Rádio Europa Livre/Rádio Liberdade no país não foi poupada. A rádio, financiada pelos EUA desde a Guerra Fria, foi classificada pelas autoridades russas como uma «organização indesejável» e os seus funcionários considerados como «agentes estrangeiros».
Um porta-voz do Departamento de Estado veio logo dizer que a proibição prova que Moscovo «não pretende que o seu povo seja informado». O facto de a Rádio Europa Livre ter sido criada em 1949 pelo «Comité Nacional por uma Europa Livre» como uma fonte de propaganda anticomunista é irrelevante, naturalmente.
Não menos irrelevante é o facto de o «caniche da América», como alguém chamou à Grã-Bretanha, tal a subserviência a Washington, manter Julian Assange encarcerado e sob a ameaça de extradição para os EUA, ou seja, para a morte. O mesmo se diga do generalizado silêncio quanto ao jornalista espanhol Pablo Gonzalez, preso quatro dias após a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 24 de Fevereiro de 2022, quando cobria a crise humanitária provocada pela guerra na fronteira com a Polónia. Continua preso sem culpa formada, acusado de espionagem pelas autoridades polacas, apenas por ter dois passaportes com nomes diferentes (em espanhol e em russo). O facto de ter dupla nacionalidade, de ser filho de pais russos que se separaram e de ter ido com a mãe para Espanha, também é irrelevante. Dois anos de prisão, dois anos ignorado no democrático «mundo livre».
Também enterrado no esquecimento foi o jornalista, bloguer e cineasta Gonzalo Lira. Americano de ascendência chilena, morreu em Janeiro na prisão ucraniana em que se encontrava desde Maio de 2023, sempre incomunicável e torturado, por criticar a NATO e os neonazismo no país.
A dualidade de critérios não é novidade, mas é sintomático que, numa altura em que as liberdades estão cada vez mais periclitantes, os caniches dos EUA proliferem como cogumelos.