Debates e circo mediático

Jorge Cordeiro

Não há risco maior para o poder do­mi­nante do que esse atre­vi­mento de cada um ousar pensar pela sua pró­pria ca­beça.

Não vá o diabo tecê-las, há quem trate de pre­venir essa pe­ri­gosa ve­lei­dade. Será a pensar em re­duzir danos que, pronta e an­te­ci­pa­da­mente, foi mon­tado o circo de co­men­ta­dores de­di­cados a tra­duzir e in­ter­pretar o que possa ter es­ca­pado a quem as­siste ao de­bates elei­to­rais. Não bas­tasse já a or­ga­ni­zação dos de­bates não deixar em mãos alheias essa cla­ri­fi­cação de que em ma­téria de acesso ao es­paço me­diá­tico há uns mais iguais que os ou­tros, há os de pri­meira e de se­gunda, há os que é pre­ciso não ofender não vão vo­arem fi­nan­ci­a­mentos, não bas­tasse isso e nada mais se­guro que ga­rantir re­dun­dân­cias, re­do­brados ex­pe­di­entes ou ou­tros tru­ques que deixem de­cre­tado o que se pre­tende dar por certo e ver­dade, mesmo que o que tenha ocor­rido ou sido dito o não au­to­rize.

Em jeito de des­file fa­lante, dis­pondo do dobro ou do triplo do tempo que quem de­bateu dispôs, un­gidos da­quela isenção que os co­loca, com hon­rosas ex­cep­ções a dizer o que as edi­to­rias de­ter­minam dever ser dito, exer­ci­tando um la­bo­rioso jogo de pa­la­vras para fingir um con­tra­di­tório ar­gu­men­ta­tivo, pelo ecrã es­bra­cejam co­men­ta­dores dis­far­çados de jor­na­listas, jor­na­listas dis­far­çados de co­men­ta­dores. Não faltam ao festim cir­cense a atri­buição de pon­tu­ação ao jeito do con­curso da Eu­ro­visão, o exer­cício de cer­ti­fi­cação da ve­ra­ci­dade por parte de quem é di­plo­mado em men­tiras e meias ver­dades, ou in­fo­gramas para ma­ni­pu­lação es­ta­tís­tica. E quando as evi­dên­cias atra­pa­lham o que está pré-sen­ten­ciado, como se ouviu no res­caldo do de­bate entre Paulo Rai­mundo e Luís Mon­te­negro, há sempre um truque capaz de repor a ordem do­mi­nante como o en­saiado por uma jor­na­lista de que «Paulo Rai­mundo pro­curou não perder e não perdeu, e Mon­te­negro pro­curou não ga­nhar e não ga­nhou», tro­ca­dilho que fi­cará nos anais do ane­do­tário co­mu­ni­ca­ci­onal.




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