VAR ideológico
Como a gente do futebol sabe, o VAR (Video Assistant Referee, também conhecido por videoárbitro) é uma ferramenta de acompanhamento de decisões. Pode confirmá-las, chamar a atenção para outras ou corrigi-las. Está de fora mas pode influenciar resultados. Suscitando a modalidade intensas paixões, não falta quem desconfie, com razão ou sem ela.
A que vem esta referência futeboleira? Obviamente, à legião dos «comentadores». O sistema vigente instalou há muito essa especialidade nos grandes media, em particular nos audiovisuais. Friedrich Hayek, um dos pais do neoliberalismo, defendeu (1949) a necessidade – para essa versão particularmente selvagem do capitalismo – de gerar «um novo tipo de intelectual». Alguém que «não necessita de possuir um conhecimento especial acerca de nada em particular, nem mesmo de ser particularmente inteligente, que desempenhe o papel de intermediário na difusão de ideias». Um «caixeiro-viajante de ideias em segunda mão cujo apoio deve ser ganho, sobretudo naquilo que é hoje designado como media, que influencia amplamente a opinião pública». Está à vista o sucesso da proposta de Hayek. Não só foram criados, como está garantido o alinhamento ideológico à direita da sua esmagadora maioria.
Esses «caixeiros-viajantes de ideias» atravancam o espaço dito «de informação». O seu papel é, obedecendo a Hayek, tentar formatar opinião, frequentemente distorcendo ou ocultando informação efectiva. Crescem em arrogância e vontade de interferir directamente na disputa política. A actual campanha eleitoral está no início e já perderam qualquer vergonha. Quereriam, como se diz de arbitragens tendenciosas, «inclinar o campo». São um problema democrático, um VAR nada isento.
Acontece que ainda está em vigor o princípio «uma pessoa, um voto». Cada «comentador» terá apenas um. Tal como qualquer outra pessoa, das que pensam pela sua própria cabeça.