O truque, o jantar e os votos
Parece que voltámos a 2022. À excepção do Secretário-Geral – antes António Costa, agora Pedro Nuno Santos –, parece que para o PS nada mudou. Pelo menos ao nível da argumentação, que continua a mesma que na altura tanto contribuiu para que lograsse atingir a desejada maioria absoluta: assegura que é a única garantia de estabilidade; afirma que só ele pode travar o crescimento da extrema-direita; destaca as virtudes da sua governação valorizando medidas exigidas pelo PCP, que o PS sempre rejeitara e que, uma vez aprovadas, foram diminuídas no seu alcance por cativações e outros truques; sublinha os males maiores que terá evitado…
No jantar de Natal do grupo parlamentar do PS, no dia 19, uma das primeiras iniciativas em que participou nas suas novas funções, Pedro Nuno Santos elogiou o legado dos governos de António Costa (dos quais fez parte), ao mesmo tempo que anunciou o desejo de fazer no futuro muito daquilo que – por opção e apenas por opção – não foi feito até agora. E revelando o mesmo desacerto com a realidade sempre demonstrado pelo seu antecessor, assegurou que com a direita no governo tudo teria sido pior: nem as pensões teriam aumentado, nem o salário mínimo nacional; a habitação, essa, teria sido deixada para o mercado. Mas não foi o PS que, juntamente com essa mesma direita, impediu aumentos capazes de repor o poder de compra perdido pela elevada inflação e a descarada especulação? E não é afinal a habitação (na qual o próprio Pedro Nuno Santos teve responsabilidades governativas directas) o sector mais liberalizado em Portugal?
Horas antes do repasto, e das palavras do Secretário-Geral, a maioria dos deputados do PS tinha-se juntado a PSD, IL e Chega – a tal direita – na recusa em exigir do Governo o reconhecimento do Estado da Palestina nos termos em que sucessivas resoluções das Nações Unidas o fazem: nas fronteiras anteriores a Junho de 1967 e com capital em Jerusalém Oriental. Fizeram-no entre manifestações de apego – convenientemente abstrato – à solução dos dois Estados e a aprovação de resoluções solicitando todos os esforços diplomáticos para que ela seja uma realidade. Quando? Logo se vê… Palavras à parte, sobram os actos: dos dois Estados só um é efectivamente reconhecido, o ocupante, e o PS nada fez, de facto, para alterar esta lamentável situação.
E no dia seguinte voltou a unir-se à direita para impedir que fossem corrigidas injustiças nas leis laborais – e nas vidas dos quase dois milhões de pessoas que trabalham por turnos, à noite, aos fins-de-semana, aos feriados, em grande parte dos casos com pouca ou nenhuma compensação. Mesmo que a produzir batatas fritas… Uma vez mais, sobrou em auto-elogios o que faltou em acções concretas.
É o PS a ser o PS. E o truque é sempre o mesmo. Quem cai?