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Carina Castro (Membro da Comissão Política)

Tantas lutas, tanta resistência e força, tanta energia transformadora, e também vitórias

Há um ano, nestas mesmas páginas partilhámos os cansaços desta altura do ano, e os cansaços das injustiças que vemos e vivemos. Falámos da coragem para lutar pela vida a que temos direito, do desafio de fazermos dos nossos sonhos força para agir. Passado um ano, somámos forças e cansaços, somámos sonhos e possibilidades.

Olho para a legislatura que agora termina e lembro-me da vez em que o Cotrim Figueiredo mandou o PS levantar-se para votar contra a proposta do PCP para defender o direito à habitação; e da vez que António Saraiva da CIP disse não estar nada preocupado com a maioria absoluta do PS, porque António Costa dizia que antes era refém dos partidos “à esquerda”; lembro-me da vez em que o Ministro da Cultura disse que tinha “sempre de haver alguma precariedade”, e depois a Ministra da Ciência e do Ensino Superior veio dizer o mesmo. Lembro-me do Ministro da Saúde desafiar o PSD a dizer uma PPP na saúde que não tenha sido criada pelo PS, só uma. Lembro-me de António Costa prometer a requalificação do IP3 e dizer que por isso não havia verba para a contagem integral do tempo de serviço dos professores, mas cada vez que vou a Viseu o IP3 continua uma desgraça. Lembro-me de António Costa dizer que as pessoas que fazem fila à porta dos centros de saúde precisam é de bons conselhos: que liguem para a Saúde 24. Lembro-me do PS e a IL votarem da mesma forma 177 propostas do PCP. Não é amor, é interesse de classe. Lembro-me de Fernando Medina falar dos resultados económicos espectaculares. Resultados, resultados, resultados. E isso fez-me lembrar Luís Montenegro com o país que está melhor, as pessoas é que não.

Lembro-me de todas as verdades que os bravos eleitos do PCP disseram naquela Assembleia da República, na última legislatura: de quando Jerónimo de Sousa confrontou o governo do PS com o significado da sua recusa em aumentar significativamente os salários e pensões: imposição de empobrecimento forçado. Lembro-me de quando a Paula Santos confrontou um secretário de Estado dizendo que acabar com a caducidade da contratação colectiva custava zero ao Orçamento do Estado, em resposta à sua afirmação de que: “temos de ser adultos, não dá para aumentar salários e defender os serviços públicos” (já parece a história do IP3). Lembro-me da vez em que o João Dias denunciou que o hospital de Beja gasta num ano em ressonâncias no privado, o preço de aquisição do equipamento; ou quando o Bruno Dias disse que para haver mais habitação é preciso menos especulação, mas que aí PS, PSD, Chega e Il não tocam; quando a Alma Rivera perguntou à IL o que é que querem mais, se o PS já “lhes” deu: desregulação dos horários de trabalho, liberalização da energia e da habitação, benefícios e borlas aos grupos económicos. Lembro-me de quando o Duarte Alves desmascarou a conversa do baixar impostos de Chega e IL “para o povo” mas a pensar na banca e nos grupos económicos. Lembro-me quando a Diana Ferreira deixou o repto ao PS para que usasse a sua maioria absoluta para aprovar uma rede pública de creches. Não usou. Lembro-me de quando o Manuel Loff assumiu não ter qualquer problema em admitir o preconceito com quem mantém trabalhadores com vínculo precário durante dois anos e de quando o Alfredo Maia falou da dureza do trabalho por turnos naquela tribuna.

Lembro-me de quando o Paulo Raimundo disse que o voto de um accionista vale tanto como o de qualquer trabalhador. Lembro-me das lutas, foram tantas por todo o lado, tanta resistência e força, tanta energia transformadora, e também vitórias. E nós estivemos lá.

Olho para 2023 e lembro-me da vez que tive de escrever, com a minha filha de quatro anos, um texto para a escola a explicar o que faz um funcionário do PCP. Fizemos um desenho e falámos das manifestações a que temos ido juntas dizer aos barrigas que temos direito a ser felizes. Que todos os meninos e meninas têm esse direito. Que não é só para nós. E a minha filha desenhou um cravo na mão da magriça que gritava ao barriga. Depois perguntou-me: oh, mãe, já não há barrigas, pois não?

Ainda não lhe expliquei que os Barrigas voltaram a engordar muito, mas ela já sabe que juntos os magriços vão voltar a vencer.

 



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