A segunda morte de D. Dinis
Voltamos ao tema da floresta e dos incêndios (com a firme desconfiança de que teremos ainda que voltar a ele antes do Verão acabar), porque o primeiro-ministro veio apontar, esta semana, o caminho para lhes dar resposta.
Genuinamente (digo eu!) preocupado com os riscos de novos incêndios, António Costa veio dizer que se só se começar a transformação estrutural da floresta na década de 2030, esta só estará completa «lá para 2060», mas que «se nós começarmos agora, vamos começar a ter resultados já em 2030, e vamos ter mais resultados em 2040», donde, e faz sentido, «não podemos perder tempo», sendo preciso avançar com a Reforma da Floresta.
Nós, que não perdemos a capacidade de nos espantarmos com as coisas que este Governo vai dizendo, não podemos deixar de lembrar duas coisas.
A primeira é que desde 2017 já se passaram seis anos e, neste período, o Governo PS teve sempre condições para fazer avançar medidas que dessem resposta aos problemas estruturais de que a floresta portuguesa padece. Não o fez porque algumas dessas medidas custam dinheiro que o Governo prefere encaminhar para as «contas certas do défice» (veja-se a velocidade de caracol a que avança o cadastro florestal, medida consensualmente considerada essencial) e outras porque beliscam os interesses dos grandes grupos económicos dos aglomerados de madeira, da pasta de papel ou da cortiça.
A segunda é que o ministro de Agricultura do PS, Capoulas Santos, em funções na altura, informou logo no ano seguinte estar já em marcha a maior reforma desde o tempo de D. Dinis, para justificar as inúmeras alterações legislativas com que o Governo quis sacudir o fogo do seu capote. Reforma que o Governo ou abandonou, como indicam pelas sucessivas alterações que, nos meses e anos seguintes, impuseram à legislação que na altura fizeram aprovar, ou decidiu não implantar pelas razões já expostas acima.
D. Dinis, o tal que, reza a história, assegurou o forte desenvolvimento do Pinhal que, ao fim de mais de 700 anos, ardeu quase totalmente no mês de Outubro desse fatídico ano de 2017, há-de estar a dar voltas na tumba e a sentir que morre uma segunda vez quando, depois da incúria ter deixado destruir a obra a que ele deu impulso, desta forma tão pouco digna, destroem assim a Reforma a que, pelos vistos, tinha dado inspiração.