Garantia
A Assembleia Geral da ONU aprovou uma resolução, a 30 de Dezembro, solicitando ao Tribunal Penal Internacional (TPI) um parecer consultivo sobre as «consequências legais decorrentes da violação contínua por Israel do direito do povo palestiniano à autodeterminação, da ocupação prolongada, colonização e anexação do território palestiniano ocupado desde 1967, incluindo medidas destinadas a alterar a composição demográfica, carácter e estatuto da Cidade Santa de Jerusalém, e da adopção de medidas discriminatórias».
A resolução, que Israel procurou impedir exercendo pressão sobre diversos países, contou com a oposição dos EUA, Reino Unido, Austrália, Áustria, Canadá, Alemanha e Itália, onde se gere princípios consoante os azimutes. A (in)coerência é particularmente acentuada pelo facto de, dois dias antes da deliberação da ONU, o novo governo de Benjamin Netanyahu, ao tomar posse, ter proclamado que o «povo judeu tem direito exclusivo e inalienável a todas as partes da Terra de Israel», incluindo os montes Golã sírios ilegalmente anexados e a «Judeia e Samaria», a Cisjordânia.
Em termos práticos, a ONU solicita ao TPI um parecer consultivo sobre a legalidade de 55 anos de ocupação violenta dos territórios palestinianos por Israel, conforme a definição de ocupação na Quarta Convenção de Genebra (1949) e no direito internacional consuetudinário, bem como a obrigação dos «Terceiros Estados Partes» de defender o estado de direito.
O novo governo israelita – uma coligação que junta o Likud, partido de direita laico, com o ultra ortodoxo sefardita Shas, o ultra ortodoxo asquenaze Judaísmo Unido da Torá, o supremacista de extrema-direita Sionismo Religioso e Poder Judeu, e o homofóbico de extrema-direita Noam, todos racistas e homofóbicos – reagiu como seria de esperar. Num discurso particularmente virulento, Netanyahu reafirmou a posição que Israel tem assumido com total impunidade face às deliberações da ONU. «Como centenas de resoluções retorcidas adaptadas pela Assembleia Geral da ONU contra Israel ao longo dos anos, a desprezível decisão de hoje não vinculará o governo israelita. A nação judaica não ocupa sua própria terra e sua própria capital eterna, Jerusalém», disse, garantindo que «nenhuma decisão da ONU pode distorcer os factos históricos».
O governo mais à direita da história de Israel não suscita preocupações nas capitais da civilização cristã e ocidental, tal como a reacção israelita à resolução da ONU, que não mereceu comentários. Também parece natural que Zelensky e Netanyahu falem ao telefone, um pedindo armas e outro votos nos fóruns internacionais, sem problemas de maior com os conceitos de ocupação e direitos territoriais. Mas não há crise. Washington e Bruxelas garantem a todos dois palmos de terra.