Evidências

Cristina Cardoso

Só a paz serve aos povos

Entrámos no final do ano e os artigos sobre a «palavra do ano», «personalidade do ano» e «acontecimentos do ano» inundam os média. Retorna-se às campanhas em que o grande capital gastou milhões para moldar o pensamento colectivo, garantindo que os povos entram no novo ano com «a lição bem decorada».

Em jeito de balanço, será difícil esquecer o que 2022 nos trouxe: o agravamento da guerra na Ucrânia e as sanções, com o povo ucraniano a ser a principal vítima, e as graves consequências para os restantes povos da Europa, com o aumento dos preços dos bens essenciais e da energia. Entramos num novo ano e eleva-se a aposta na escalada da confrontação e da guerra, com os sérios perigos que comporta para o futuro da Humanidade, continuando a ser omitido e escamoteado o que conduziu à actual situação e os seus principais protagonistas.

São apresentados como heróis os que proclamam por mais armamento e financiamento bélico, fechando portas a negociações de paz. A deslocação de Zelensky aos EUA em vésperas de Natal, aludindo aos acontecimentos da II Guerra Mundial, em encenação holiwoodesca e romantizada, não teve só como objectivo cobrar maior financiamento. Serviu também para convencer o mundo de que só há um caminho a seguir: a continuação da guerra e a destruição da Rússia.

Na conferência de imprensa conjunta, Biden afirmou que a Ucrânia pode contar com todo o apoio, pelo tempo que for necessário, financeiro e em armamento, incluindo sistemas de míssil Patriot. A administração norte-americana entregou à Ucrânia, desde Janeiro de 2022, 47,8 mil milhões de euros, dos quais 23 mil milhões em meios militares, tendo já sido aprovado no Senado mais um pacote de 47 mil milhões para 2023.

Rejeitando aparentemente o pedido de armas mais sofisticadas por parte de Zelensky, Biden também afirmou que entregar este tipo de armas à Ucrânia teria como consequência «desintegrar a NATO, desmembrar a Europa e o resto do mundo», observando que outros aliados não estão à procura de uma III Guerra Mundial ao combater directamente a Rússia.

Perante tais afirmações, fica por demais evidente – coisa que por aqui já se afirmou muitas vezes – que por detrás deste conflito sempre esteve e continua a estar o imperialismo norte-americano, que alimenta a escalada para servir os seus interesses hegemónicos.

Ao longo dos anos, EUA e NATO prosseguiram uma estratégia de alargamento, expansão e colocação de armamento, bases e contingentes militares junto às fronteiras da Rússia; o papel dos EUA no golpe de Estado de 2014, em que a então subsecretária de Estado dos EUA, Victoria Nuland, assumiu a utilização de 5 mil milhões de dólares na desestabilização e subversão que conduziu à mudança de regime na Ucrânia, levado a cabo pelos sectores mais reaccionários da oligarquia ucraniana, e a uma guerra desencadeada pelo governo golpista contra as populações do Donbass, que desde 2014 a 2021 causou mais de 14 mil mortos.

Do ano 2023, só podemos exigir e lutar para que seja melhor, sendo que só a paz serve os interesses dos povos. É urgente que os EUA, a NATO e a UE cessem de instigar e alimentar a guerra na Ucrânia e que se abram vias de negociação com os demais intervenientes, nomeadamente a Federação Russa, visando alcançar uma solução política para o conflito, a resposta aos problemas de segurança colectiva e do desarmamento na Europa.

 



Mais artigos de: Opinião

Sentes-te cansado?

Chegados ao final de mais um ano é tradição fazer-se listas de resoluções e desejos para o ano vindouro. Já fizeste a tua? Este é também o tempo em que a publicidade electrizante nos entra em casa, olhos e ouvidos adentro, e ficamos demasiadas vezes a pensar no que «falhámos» para não...

Natal, os média e os seus trabalhadores

«O Natal pode ser ... deprimente … (com) as piores características do capitalismo ... É impossível escaparmos … E, no entanto, ... sufocado (por) ... catálogos de prendas … e música de elevador ... queima uma chama secreta ... de uma esperança revolucionária … de um mundo melhor, uma sociedade mais justa, onde a ordem...

Declarações sobre uma indemnização

Alguém saiu de Administrador da TAP, onde recebia um salário de 16 mil e tal euros, quando lhe faltavam dois anos de mandato, e recebeu uma indemnização de meio milhão de euros. Ao sair assinou um contrato de confidencialidade, que leva agora a TAP a negar esclarecimentos sobre essa saída. Esse alguém foi logo depois...

O regresso dos livros proibidos

«Um ataque ao conhecimento e ao pensamento crítico», é como Randi Weingarten, presidente da Federação Americana de Professores, classifica a campanha que extremistas de direita estão a levar a cabo para banir das bibliotecas escolares, das salas de aula e mesmo das bibliotecas públicas livros sobre racismo, questões de...

Legado e projecto

Há precisamente um século, a 30 de Dezembro de 1922, nascia a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Constituída cinco anos após a Revolução de Outubro pelas repúblicas socialistas da Rússia, Ucrânia, Bielorrússia e Transcaucásia (que se dividiu mais tarde em Arménia, Azerbaijão e Geórgia), agregou ainda – e...