O Rei vai nu

João Frazão

A Rainha de Inglaterra morreu aos 96 anos. Para o seu funeral desenvolveram-se, sem surpresas, cerimónias de Estado que procuram envolver o povo britânico. O novo Rei foi empossado e iniciou funções. Estes são os factos. Tudo o resto é folclore. Não mereceria mais do que estas linhas.

A comoção que se tentou impor ao povo português merece, entretanto, dois ou três comentários.

Desde logo, pela extraordinária decisão do Governo de decretar três dias de luto nacional, por uma chefe de Estado estrangeira, ainda por cima associada, ao longo dos seus 76 anos de reinado, a um sem número de atropelos à soberania dos povos.

A posição de subserviência e bajulação em que o País se coloca é confrangedora e não há velha aliança – que aliás tem sido sempre usada para o favorecimento dos interesses do capital dos dois lados do Atlântico – que lhes valha.

Mas o que mais me faz impressão é não perceber onde estão os moralistas do costume, os críticos do culto da personalidade de todas as horas, os democratas de pacotilha, nesta circunstância?

Agora que estão caladinhos que nem ratos perante um tratamento jornalístico que mais não é que propaganda – ainda por cima enganosa em muitas situações - a um sistema caduco e indefensável, pensamos em quantas circunstâncias não os vimos pregar moral sobre como é que cada um, em cada país, ou melhor, nos países dos outros, e designadamente a comunicação social dos outros, se deveria comportar, o distanciamento que deve assumir com o poder político, a isenção que é recomendada.

Agora que referem os hábitos dos cães da senhora falecida, que emitem centenas de horas de televisão com todos os aspectos da sua vida, até ao mais ínfimo pormenor, sempre com uma áurea de imaculidade inquestionável, quando fazem sucessivos apelos para que as populações venham em massa para a rua chorar, juntamente com as pedras da calçada, a soberana mãe de todos, perguntamos por aqueles que, noutras ocasiões, são tão lestos a condenar o culto da personalidade.

E mais, não os vemos agora rasgar as vestes perante a arbitrariedade antidemocrática que é a prisão de quem grita «Viva a República», de quem condena a monarquia, ou de quem, como sempre é sábio fazer, denuncia que o Rei vai nu, mesmo sendo, a falecida, rainha!

 



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