Salários e hipocrisia

Vasco Cardoso

A inflação galopante está a corroer os salários a cada dia que passa. As condições de vida dos trabalhadores agravam-se. As injustiças na distribuição da riqueza aprofundam-se com a escandalosa acumulação de lucros por parte do capital. A invocada falta de mão-de-obra, em tantos e tantos sectores, está também a pôr a nu o problema de fundo que são os baixos salários que se praticam em Portugal. O aumento geral dos salários assume-se, de facto, como emergência nacional.

Perante isto, o primeiro-ministro, servindo-se de uma plateia de jovens (presentes no Encontro Nacional de Associações Juvenis) veio a público pedir um «esforço» aos empresários para que estes aumentem os salários. Não fosse a conhecida capacidade do PS em ter um discurso tantas vezes oposto à sua prática e quase que seríamos tentados a considerar como genuíno um discurso que está carregado de cínica hipocrisia.

O PM e o PS sabem que o aumento dos salários não se alcança com apelos. Precisa de medidas concretas que afrontem os interesses do capital. Reclama a eliminação da caducidade da contratação colectiva em vez de manter esta e outras normas gravosas da legislação laboral, ou até agravá-la, como pretende agora o governo. Exige o aumento do salário mínimo nacional para os 850 euros no curto prazo. Impõe a recuperação e valorização dos salários dos trabalhadores da administração pública em vez da prolongada perda de poder de compra que se verifica há mais de uma década e se confirmou no último Orçamento do Estado. É tudo isto que o Governo PS recusa com o apoio das forças reaccionárias, PSD, Chega, IL e CDS.

Esta forma de dizer o contrário daquilo que se faz, de atirar para a frente aquilo que se exigia que fosse feito agora, ou até, que já deveria ter sido feito é uma velha habilidade do PS, mestre em mascarar de esquerda a política de direita com que está comprometido.

Não serão, no entanto, os falsos apelos do Governo que criarão as condições para o aumento dos salários. Será a luta dos trabalhadores, essa força imensa que precisa de ser ainda mais organizada e mobilizada, que acabará por impor o que é justo. Nada cairá do céu.

 



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