A paz não (se) vende

Gustavo Carneiro

Está visto: a paz não vende jornais nem garante audiências. Ou então, numa visão menos ingénua, quem manda (nos media e não só) está mais apostado em prolongar a guerra, ampliar as vendas de armamento, continuar a alargar a NATO e esmagar ainda mais os povos sob o peso das sanções do que em procurar caminhos de negociação e diálogo. A paz, aparentemente, também não garantirá lucros assim tão fabulosos.

Assim se explica que a paz não tenha grande expressão mediática, nem sequer quando é o Papa a reclamá-la. Silêncio, deturpação, chacota – é ao que hoje são condenados os que não desistem de a defender.

Em plena histeria em torno da provável entrada da Finlândia e da Suécia para a NATO, a generalidade das televisões, rádios e jornais não achou relevante noticiar a realização de manifestações nas cidades suecas de Estocolmo e Malmö contra essa mesma adesão. Convocadas sob o mote Não à NATO – Juntos pela Paz, as acções foram promovidas por partidos políticos, associações de mulheres e de estudantes, movimentos culturais e de defesa da paz, organizações religiosas.

Entre os participantes houve quem salientasse que a opção não é «entre a NATO e a Rússia, mas entre a guerra e a paz» e que, tratando-se de uma «aliança de guerra», nunca a adesão da Suécia constituiria um «acto de paz». Outro foi ainda mais longe, realçando que o país ficará mais vulnerável, podendo ser colocado na «linha de fogo» em guerras que não lhe dizem respeito. Num cartaz empunhado numa das manifestações, garantia-se que A Suécia não precisa da NATO para a paz, a NATO é que precisa da Suécia para a guerra. Argumentos válidos, reconheça-se, que inclusivamente sustentaram durante décadas a neutralidade do país, posta agora em causa.

Também na Grécia foram milhares os que protestaram no dia 12 contra as bases norte-americanas no país e o aprofundamento do acordo militar com os EUA, debatido nesse mesmo dia no Parlamento. Os manifestantes rejeitaram qualquer participação grega na guerra através do envio de material militar que, garantem, é efectuada «em nome dos EUA, da NATO e da UE». Sobre isto, também pouco ou nada se viu, leu e ouviu – por cá e não só.

À margem da atenção mediática ficaram também as manifestações massivas realizadas há dias no Japão, contra a intenção do governo de rever a Constituição do país, sobretudo na sua componente pacifista, consagrada desde o fim da Segunda Guerra Mundial, e de aumentar exponencialmente os seus gastos militares.

Não espantará, pois, se os desfiles pela paz marcados para os dias 25 e 29 de Junho, em Lisboa e no Porto, passarem ao lado das agendas informativas. Porém, e como afirmou uma das organizadoras das acções na Suécia, «a resistência existe e precisa de ser vista». Nas ruas.




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