Patrões a passo de caracol nas negociações salariais
As administrações de grandes empresas e grupos, como a EDP, a REN, os CTT e a Brisa, mantêm propostas de actualização salarial de meio por cento, ou menos, para alimentarem os lucros e os dividendos.
Cada 100 euros gastos com trabalhadores somaram 559 euros no VAB da EDP
Na terceira reunião de negociação, dia 16, os representantes da EDP (Energias de Portugal) não alteraram a proposta apresentada duas semanas antes, insistindo em actualizar a tabela salarial em 0,5 por cento. No dia seguinte, quando foram divulgadas as contas de 2021, a mesma administração anunciou que pretende, mais uma vez, distribuir aos accionistas dividendos superiores ao lucro obtido.
O contraste foi assinalado pela Fiequimetal/CGTP-IN, numa nota de imprensa em que comentou o «considerável resultado líquido de 657 milhões de euros (ou 1105 milhões, contando os “interesses não controláveis”)», contabilizado pela EDP em 2021.
Esta encabeça «um grupo empresarial considerado “Top Employer” e que se auto-denomina familiarmente responsável», mas «não tem pejo em propor novamente uma quebra de poder de compra para os seus trabalhadores». A federação lembrou que «estes, segundo o Conselho de Administração Executivo, estão no centro das preocupações e são o activo mais valioso da EDP», enquanto a proposta salarial patronal significa «valores entre 5 e 21 euros, que são manifestamente insuficientes».
Em 2021, registou ainda a Fiequimetal, em média, cada trabalhador contribuiu com 304 266 euros para o VAB (valor acrescentado bruto) do Grupo EDP, que gastou apenas 54 429 euros com cada trabalhador.
Segundo a federação, aceitar a proposta sindical de mais 90 euros nos salários de todos os trabalhadores representa apenas mais 8,5 milhões de euros, «uma ninharia, perante o resultado líquido recorrente» de 826 milhões de euros no ano passado.
Para iniciar a negociação salarial de 2022, no dia 18, a administração da REN (Redes Energéticas Nacionais) «apresentou uma proposta irrisória de apenas 0,5 por cento». Num comunicado aos trabalhadores das empresas do grupo que gere as principais infra-estruturas de transporte de electricidade e de gás natural, a Fiequimetal revelou ainda que os representantes patronais recusaram negociar as propostas sindicais sobre outras matérias, como a redução progressiva do horário de trabalho, o aumento dos dias de férias ou a recuperação do valor do trabalho suplementar.
A iniciar as negociações de revisão anual do acordo colectivo de trabalho, no dia 16, os representantes das empresas do Grupo Brisa avançaram com 0,5 por cento, para actualização salarial, e rejeitaram outras propostas do CESP/CGTP-IN. Destas, o sindicato realçou a recusa patronal de acabar com o limite do valor das diuturnidades, que não pode passar 25 por cento do salário-base. Esta situação «penaliza fortemente as remunerações mais baixas, como as dos trabalhadores da obra civil, os mais afectados pelas políticas de baixos salários».
No comunicado em que critica «a mesma indisponibilidade» e «a velha intransigência» das empresas do Grupo Brisa, o sindicato observa que as contas anuais, divulgadas no dia da reunião, revelam uma subida do resultado líquido da concessionária rodoviária, para 183,2 milhões de euros, em 2021. Este valor representa mais 47,4 por cento do que os 124,2 milhões alcançados no ano de 2020.
Com uma sessão de negociação marcada para ontem, dia 23, os CTT (Correios de Portugal) pouco evoluíram desde que, há mais de um mês, apresentaram «treze páginas de palavreado», como o SNTCT então classificou a contraproposta que se traduzia em aumentos de zero a 0,37 por cento na tabela salarial. No ano passado, a administração propôs 0,33 por cento, lembrou o sindicato da Fectrans/CGTP-IN, classificando a posição patronal como «uma ofensa e um insulto aos trabalhadores».
Há duas semanas, os representantes da empresa evoluíram 50 cêntimos, relatou ao Avante! o Secretário-geral do sindicato. Victor Narciso adiantou que, na CTT Expresso, onde a proposta patronal é de 10,00 euros para todos, a negociação «também está a correr mal».
Num e noutro caso, «os trabalhadores vão ter de dizer alguma coisa» para alterar o posicionamento dos patrões.
Plenários de trabalhadores
No dia 8, em plenário, os trabalhadores do armazém da Worten na Azambuja exigiram resposta positiva ao caderno reivindicativo. Segundo um comunicado do CESP, o plenário «teve participação massiva» e mandatou o sindicato para, «em momento oportuno, emitir um pré-aviso de greve no período da Páscoa».
Com grande crescimento das vendas e perspectivas de essa subida aumentar, a empresa do Grupo Sonae paga o salário mínimo nacional a trabalhadores «com cinco, 10, 15 e mais anos de antiguidade», acusou o CESP.
Desde dia 11 e até 4 de Março, o Sitava/CGTP-IN está a promover plenários de trabalhadores da ANA (Grupo Vinci) nos aeroportos, procurando decidir as formas de dizer «basta». A administração não cumpre as evoluções nas carreiras profissionais, a que está obrigada pelo acordo de empresa (AE), e implantou um sistema de avaliação de desempenho que é uma «ardilosa iniciativa» para prejudicar os trabalhadores.
O sindicato refere ainda, num «triste rol de atitudes da administração», a chantagem com a denúncia do AE, a decisão unilateral de deixar de contribuir para o fundo de pensões e a falta de resposta à proposta de revisão salarial de 2022.
A convocação, a breve prazo, de um novo plenário de trabalhadores da Carris (CM Lisboa) foi admitida pelo STRUP. Conjuntamente com o SNMOT, o sindicato da Fectrans/CGTP-IN convidou todas as organizações sindicais a perspectivar a resposta a dar à administração na reunião agendada para 4 de Março.
Num comunicado de dia 21, o STRUP acusou a administração de «andar a passo de caracol», chegando aos 20 euros de actualização salarial no dia 18, depois de não ter alterado a posição (10 euros) na reunião de dia 2. «A forte participação dos trabalhadores no plenário geral de 27 de Janeiro obrigou a administração a dar resposta a um conjunto de reivindicações», salientara então o sindicato.
Mas «não aceitamos que o nosso salário-base seja paulatinamente absorvido pelo salário mínimo nacional», «depois da perda de poder de compra acumulada nos últimos 12 anos», frisou agora o STRUP, apelando à «acção contra a provocação».