A lira do capitalismo

Jorge Cadima

É real o perigo de provocações do imperialismo

Reza a lenda que o Imperador Nero tocava lira enquanto Roma ardia. Dois anos de pandemia «viram os rendimentos de 99% da Humanidade caírem e lançaram mais de 160 milhões de pessoas na pobreza», mas «os dez homens mais ricos do mundo duplicaram as suas fortunas» a um ritmo de «1,3 mil milhões de dólares por dia» (relatório sobre a desigualdade da Oxfam, 17.1.22). Para os gigantes farmacêuticos, a COVID foi um maná. O Financial Times (8.1.22) anuncia que «os bancos de Wall Street preparam-se para anunciar lucros recorde em 2021». A Oxfam explica o que é o capitalismo em tempos de COVID: «os bancos centrais canalizaram triliões de dólares para os mercados financeiros […que] em boa parte acabaram por encher os bolsos dos bilionários». Mas esta «pilhagem liberal» é também um salve-se quem puder de fim de época.

Não cabe nesta coluna a lista das guerras, invasões, subversões e provocações desencadeadas pelos EUA/NATO/UE nas últimas décadas. Mas agora acenam com uma ameaça russa ou chinesa. É como o bully na escola que se põe a chorar quando uma vítima diz basta!. Ainda é cedo para fazer um balanço das reuniões Rússia-EUA, Rússia-NATO e na OSCE, que decorreram de 10 a 14 de Janeiro. Mas o facto de ser uma iniciativa diplomática russa (que alguns apelidaram ultimato) que origina esta série de reuniões é sinal de que a ditadura planetária unilateral dos EUA que se seguiu às contra-revoluções do final do século XX enfrenta hoje uma correlação de forças mundial diferente. Que é indissociável de três aspectos fundamentais e interligados: a resistência de povos e países em luta pela sua soberania, que dá sinais de crescente convergência; o impetuoso crescimento económico de países, com destaque para a RP China, que alterou a correlação de forças económicas mundial; e a profunda crise do sistema capitalista e dos principais centros imperialistas, EUA e a UE, que agudiza todas as contradições e cria a possibilidade real de sobressaltos económicos, políticos e sociais.

A verdadeira ameaça para a paz e para os povos reside no decadente sistema capitalista que, incapaz de resolver as suas contradições, aposta cada vez mais no autoritarismo, na violência, na guerra e na sua companheira inseparável: a mentira. Permanente e cada vez mais desligada da realidade, mas veiculada de forma incessante pelo aparato de propaganda que dá pelo enganador nome de meios de comunicação social.

É real o perigo de provocações do imperialismo, que possam ser usadas para tentar justificar uma aventura militar de consequências imprevisíveis. Aquando dos Jogos Olímpicos de Verão de 2008 em Pequim, o imperialismo lançou os seus subdítos georgianos numa aventura militar que provocou a morte de vários soldados russos. Aquando dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2014 na Rússia, o imperialismo lançou o golpe de Estado na Ucrânia que levou fascistas assumidos a ocupar altos cargos de poder naquele país e provocou a revolta no Donbass. Aproximam-se os Jogos Olímpicos de Inverno de 2022, que começam a 4 de Fevereiro, em Pequim. Toda a vigilância é pouca.




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