«Erros de avaliação»
Um dos temas após a debandada dos EUA/NATO do Afeganistão é que «houve erros de avaliação». Erraram a avaliar a insustentabilidade do governo fantoche instalado e das suas forças armadas, erraram a avaliar a facilidade com que os taliban assumiram o controlo.
Não será isto surpreendente? Não basta afinal ligar um qualquer canal na televisão para verificar que existe um largo manancial de abalizados especialistas em taliban e Afeganistão? Quase que são ainda mais do que os especialistas mediáticos em COVID que há dois anos nos fornecem as mais fundamentadas – mesmo que frequentemente contraditórias – opiniões sobre o evoluir da pandemia.
O que é que lhes faltou, e faltou aos EUA/NATO e aos imperialistas ocidentais em geral? Provavelmente, foi mais o que sobrou do que o que faltou. Sobrou tomarem como boas as proclamações da potência dominante entre eles e julgarem dispor de cobertura moral para toda a criminosa conduta e acção empreendida. Diz o Secretário de Estado de Biden, Antony Blinken: «No decurso da passada década e meia, os EUA aumentaram consistente e sistematicamente os seus esforços no sentido de deter atrocidades em massa», e talvez esta desavergonhada hipocrisia ajude a compreender não apenas os «erros de avaliação» mas também o impacto global desta derrota.
Para a qual terá igualmente contribuído a arrogância, arrogância com uma fortíssima tintura racista e colonialista. Veja-se o elucidativo balanço do que «aprendemos desde o 11 de Setembro» que o reaccionário filósofo francês Bernard-Henry Levy fazia, em 2001: «os taliban não foram apenas vencidos. Foram-no sem combater. Foram-no vergonhosamente, sem qualquer ponta de honra. E a imagem destes combatentes derrotados que, de Damasco a Túnis, a rua árabe tinha aureolado de todos os prestígios, a imagem destes Saladinos que se supunha irem fazer ajoelhar a América e que, ao primeiro golpe, debandaram como galinhas, não pôde senão deixar estupefactos os que se reconheciam neles.» O que este homem pensava do Afeganistão é o que toda esta gente pensa do mundo que antes colonizaram e sobre o qual acreditam manter todo o direito de ingerência e ocupação.
Será por isso que sofrem tão pesadas – mas longe de definitivas – derrotas.