Tim em defesa da cultura na Festa que faz parte da sua vida
Tim é vocalista, baixista e compositor dos Xutos & Pontapés e sobretudo nessa qualidade marcou presença por diversas – e entusiasmantes – ocasiões na Festa do Avante!, que considera parte da sua vida. Este ano volta à Atalaia para apresentar o seu novo álbum a solo, 20-20-20, para um espectáculo em que estará acompanhado pelos filhos Sebastião e Vicente e por Teresa Salgueiro.
Em 1999 o Tim lançou o primeiro álbum a solo e daí para cá já gravou mais alguns, incluindo o Três Vintes ou 20-20-20, do ano passado. Há algum conceito unificador entre essas gravações ou cada uma deve ser considerada uma unidade individual, uma peça única que representa o Tim artístico dessa época? O que liga e o que separa todas essas gravações e esses trabalhos com o do Xutos?
Os meus trabalhos a solo são fruto em grande medida pela gosto que tenho pela composição e pela guitarra. Nos Xutos sempre fui baixista e trabalhei com grandes guitarristas, mas mesmo compondo algumas malhas das mais conhecidas do grupo, não tinha espaço para as tocar, depois tanto na Resistência como no Rio Grande voltei a tocar com os mestres (Rui Veloso; Pedro Jóia; Mário Delgado; João Gil) e todo este convívio fez crescer em mim o desejo de trabalhar a guitarra. Portanto, os temas vão surgindo, eu vou-os guardando à espera de uma oportunidade para os tornar públicos, aproveito para convidar outros músicos para integrar a banda e cá vamos nós!
Em entrevistas que deu sobre o 20-20-20 explicou que a música aí criada foi também trabalhada com os seus dois filhos, Vicente e Sebastião, que fazem parte da banda. Como é que os seus filhos se envolveram no mundo da música e como é que começaram a trabalhar consigo?
Ao longo destes discos tenho trabalhado com vários músicos, a quem agradeço a colaboração. Quando estava a preparar o Olhos meus, o primeiro, ensaiava na garagem de minha casa e o meu filho mais velho, Sebastião, ajudava nas gravações dos ensaios. Tanto ele como o mais novo, Vicente, já frequentavam o Conservatório de Santarém, mas foi nessa altura que o Sebastião teve uma bateria à disposição e que se apaixonou pelo instrumento. Entretanto, o tempo foi passando, eles cresceram, tornaram-se músicos, e eu quis mostrar-lhes o que era o ambiente musical de Almada nos anos do rock português e para isso fizemos o À sombra do Cristo-rei, disco com versões dos UHF, Iodo, Grupo de Baile... Demo-nos muito bem, musicalmente, e quando decidi arrancar com o 20-20-20 foi com eles os dois que desenvolvi o projecto.
Na Festa do Avante! vai apresentar apenas os temas desse seu disco a solo ou juntará mais repertório? Qual?
Vou aproveitar esta excelente oportunidade para mostrar o Três Vintes, entre o lar, a praia e o palco, vamos começar o concerto por aí... Mas a partir do meio começam as surpresas para fecharmos com o meu clássico Voar.
Porque é que pediu a Teresa Salgueiro para ser a artista convidada do seu espectáculo na Festa?
Foi-nos pedido para convidarmos outro artista para o nosso concerto como forma de apoio à classe nestes tempos mais difíceis... Ora, sendo da mesma geração musical mas de géneros diferentes, damo-nos muito bem e temos visões próximas e, além disso, já tive o prazer de tocar com ela noutras ocasiões e achámos os dois que ia ser porreiro trabalhar algumas surpresas para apresentar em exclusivo na Festa.
A Festa do Avante! realiza-se pela segunda vez num contexto de pandemia, permitindo a alguns artistas exercerem a sua profissão em condições de segurança, quer para eles, quer para o público. O exemplo dado o ano passado, provando que era possível organizar eventos de grande dimensão em segurança, aparentemente não foi muito seguido ou raras vezes foi replicado pelos vários promotores de espectáculos. Encontra alguma explicação para isso?
Penso que, no caso dos privados, a diminuição da receita e o aumento do risco levaram ao cancelamento de várias iniciativas por todo o País. Menos compreensível foi o que se passou com as entidades públicas, nomeadamente câmaras municipais, que preferiram privar o público dos concertos ao sabor de perspectivas eleitorais. Gosto de realçar isto de privar o público, pois acho que a cultura é uma necessidade básica e, como tal, não pode ser tratada como um adereço que se esquece quando não dá jeito.
Para além de ter solicitado aos artistas deste ano que, na medida do possível, convidassem para o seu espectáculo outros artistas, a Festa do Avante! lembrou-se também de pedir, a cada um, uma interpretação pessoal de uma das canções incluídas no álbum Cantigas do Maio, de José Afonso. Aceitou este desafio? E se sim, que canção desse disco escolheu para cantar na Atalaia?
Excelente ideia e claro que sim! Esse disco fazia parte da pequenina colecção de discos de meu pai, portanto conheço-o bem. Vamos, nós e a Teresa, interpretar o Maio, maduro Maio, já que faz parte também do repertório da Teresa desde o projecto Filhos da Madrugada, onde cantava nos Madredeus. Se por acaso outro artista o escolher também, não faz mal porque, como se costuma dizer «quando a música é fina, rebobina»!
Não sabemos se o Tim é um recordista de presenças na Festa do Avante!, mas é certamente dos que lá foram mais vezes, sobretudo na qualidade de vocalista dos Xutos & Pontapés. O que é que pensa sobre a Festa do Avante!?
A Festa do Avante! faz parte da minha vida. Ajudou e muito ao crescimento da carreira dos Xutos, foi sempre um local de referência para o sentir da cultura portuguesa. Pessoalmente, tive o prazer de tocar com os vários projectos em que me envolvi, tanto no Auditório 1.º de Maio como no Palco 25 de Abril, e de conviver com tantos artistas durante a Festa, que só posso agradecer a todos os que ao longo dos anos dedicam parte da sua vida a tornar a Festa num acontecimento tão aguardado e de tamanha importância.
Bem hajam e boa Festa!