Altice: os trabalhadores como arma de arremesso

Vasco Cardoso

Para os accionistas da francesa Altice, a quem venderam a Portugal Telecom, não basta ver crescer os seus lucros (2,12 mil milhões de euros em 2020) como aconteceu neste sector - venda de serviços de telefone, internet e TV – ao longo da epidemia. Para os donos daquela que outrora foi a maior empresa portuguesa, os trabalhadores, a quem gostam de chamar «os nossos colaboradores», são apenas um instrumento, uma pequena peça ao serviço dos milhões de euros de dividendos que distribuem anualmente. Esta semana, o CEO da Altice Portugal anunciou mais um despedimento colectivo de 300 trabalhadores, aduzindo razões como «o contexto muito adverso que se vive no sector das telecomunicações»??!!, «o ambiente regulatório hostil», «o atraso no 5G» ou «um conjunto de decisões graves da ANACOM e de outras autoridades, sempre com cobertura da tutela».

Se o essencial dos mais de 5000 trabalhadores que foram despedidos da Altice Portugal nos últimos anos foi para aprofundar a exploração dos que ainda ficaram e dos que entraram de novo, neste caso, este despedimento tem também outros fins. Não só visa “emagrecer” a empresa preparando a sua alienação (já ninguém esconde as negociações para a venda da Altice Portugal à Telefónica espanhola), como constitui uma descarada tentativa de usar os trabalhadores como arma de arremesso perante o poder político e as diferentes autoridades que não se ajoelhem completamente perante os seus interesses. Uma inaceitável chantagem e pressão junto da ANACOM e do Governo, que é partilhada com os restantes operadores de telecomunicações – Vodafone, NOS - para aceder ao espaço eletromagnético nacional por menos dinheiro e ainda menos obrigações e para que seja travada a entrada de novos operadores no mercado.

Sem ter qualquer ilusão sobre o Governo PS e os interesses de classe que em última instância defenderá, e ainda menos sobre o papel das ditas entidades reguladoras (ANACOM), o facto é que esta atitude é reveladora sobre até onde os grupos monopolistas estão dispostos a ir. Uma realidade que só vem tornar ainda mais evidente a necessidade do País recuperar o que já teve: um operador público de telecomunicações.




Mais artigos de: Opinião

A «Tour» de Von Der Leyen

Uma «tour» aos 27 Estados membros da União Europeia para «anunciar» a «luz verde» da Comissão Europeia aos «Planos de Recuperação e Resiliência» apresentados por cada um deles à Comissão. Parece uma caricatura, mas não é … A Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, decidiu que iria pessoalmente a cada um...

A culpa do Ministro

Aconteceu recentemente mais um lamentável acidente numa auto-estrada portuguesa. Um carro atropelou mortalmente um trabalhador que executava operações de manutenção da via. Ao contrário do que é costume, a notícia teve destaque nacional. Não porque tenha morrido um trabalhador, mas porque sentado no carro estava um...

Retribuir

Quando estas linhas foram escritas não era ainda conhecido o desfecho da votação de ontem, na Assembleia-geral das Nações Unidas, reclamando o levantamento do bloqueio norte-americano contra Cuba. Mas a julgar pelos resultados mais recentes, não será demasiado ousado prever um clamor massivo, quase unânime: 191 Estados a...

CDU: pelo direito à cidade!

No seu Lisboa, Livro de Bordo, José Cardoso Pires deixou um aviso à navegação, uma espécie de lembrete, que bem podia ser dirigido aos sucessivos ocupantes dos Paços do Concelho da capital: «isto aqui não é só luz e rio...».

Sullivando

Dias após a cimeira entre Biden e Putin, o Conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, anuncia novas sanções contra a Rússia. Os pretextos são as já estafadas mentiras anti-russas: alegados ciberataques, alegadas interferências em eleições, o alegado envenenamento de Navalny. Salivando, Sullivan anuncia já...