Palestina: basta de crimes e de hipocrisia

Ângelo Alves


Su­cedem-se os crimes e as vi­o­la­ções das re­so­lu­ções da ONU

O pre­sente ciclo de agressão contra o povo pa­les­ti­niano cons­titui mais uma de­mons­tração da na­tu­reza ter­ro­rista e ra­cista da po­lí­tica de ocu­pação e re­pressão is­ra­e­litas. O go­verno de Is­rael es­co­lheu o pe­ríodo do Ra­madão para levar a cabo um con­junto de pro­vo­ca­ções contra a po­pu­lação pa­les­ti­niana, em par­ti­cular em Je­ru­salém.

Desde o dia 23 de Abril – quando mais de cem pa­les­ti­ni­anos foram fe­ridos pela po­lícia quando pro­tes­tavam contra uma pro­vo­cação dos co­lonos si­o­nistas que or­ga­ni­zaram uma marcha junto a um bairro mu­çul­mano em Je­ru­salém com gritos de «morte aos árabes» – que a po­lícia, o exér­cito, a ex­trema-di­reita e os co­lonos ar­mados foram ele­vando o nível de pro­vo­cação, vi­o­lência e agressão. Até ao mo­mento da re­dacção deste texto cerca de meio mi­lhar de pa­les­ti­ni­anos foram fe­ridos em Je­ru­salém às mãos das forças da ordem is­ra­e­litas e da sua tropa de choque de ex­trema-di­reita.

Desde o início que foi claro o ob­jec­tivo de Is­rael: de­sen­ca­dear uma es­ca­lada que «jus­ti­fi­casse» ainda mais vi­o­lência. As ac­ções contra fa­mí­lias de vá­rios bairros, es­pe­ci­al­mente contra a po­pu­lação do bairro Sheikh Jarrah, onde cerca de 70 fa­mí­lias pa­les­ti­ni­anas que ali vivem há dé­cadas estão ame­a­çadas de ex­pulsão; as su­ces­sivas ondas de re­pressão das forças po­li­ciais e do exér­cito; as pro­vo­ca­ções na Es­pla­nada das Mes­quitas, são apenas três exem­plos de au­tên­ticos crimes e de vi­o­lação das re­so­lu­ções da ONU, no­me­a­da­mente sobre o Es­ta­tuto de Je­ru­salém.

Como era pre­vi­sível, a es­ca­lada de pro­vo­cação con­duziu a uma re­volta ge­ne­ra­li­zada do povo pa­les­ti­niano na Cis­jor­dânia e na Faixa de Gaza. Esse foi o «pre­texto» de Is­rael para de­sen­ca­dear uma nova agressão em larga es­cala, in­se­pa­rável da crise po­lí­tica is­ra­e­lita e das di­fi­cul­dades de Ne­tanyahu e do uso da guerra para a po­lí­tica in­terna is­ra­e­lita e para con­so­lidar e avançar na po­lí­tica de co­lo­ni­zação e ane­xação de ter­ri­tório, Je­ru­salém in­cluído. Ao mo­mento em que es­cre­vemos estas li­nhas as bombas já caíram sobre Gaza. Só na pas­sada se­gunda-feira, dia 10, vinte pa­les­ti­ni­anos foram mortos com os bom­bar­de­a­mentos na­quele ter­ri­tório exíguo, su­jeito há dé­cada e meia a um cerco por terra, mar e ar, trans­for­mado numa gi­gan­tesca prisão a céu aberto e em campo de tiro da avi­ação is­ra­e­lita.

Aquilo que se está a passar na Pa­les­tina é uma re­pe­tição de epi­só­dios an­te­ri­ores. É mais um passo na ten­ta­tiva de con­cre­ti­zação de um per­verso e te­ne­broso plano que visa, fri­a­mente, passo a passo, por via de factos con­su­mados e crimes tornar in­viável na prá­tica a re­so­lução da questão pa­les­ti­niana de acordo com o con­sa­grado nas re­so­lu­ções da ONU, que re­co­nhecem ao povo pa­les­ti­niano o di­reito a edi­ficar o Es­tado da Pa­les­tina nas fron­teiras an­te­ri­ores à ocu­pação is­ra­e­lita de 1967, com ca­pital em Je­ru­salém Leste e com o di­reito de re­torno dos mi­lhões de re­fu­gi­ados ex­pulsos da sua terra. Um plano que só é pos­sível de levar a cabo porque Is­rael con­tinua a gozar do total apoio dos EUA, no­me­a­da­mente na questão de Je­ru­salém, e da im­pu­ni­dade re­sul­tante da hi­po­crisia da União Eu­ro­peia, que mais uma vez está já a co­locar em pé de igual­dade agres­sores e ví­timas, ocu­pantes e ocu­pados.

Basta de falsas equi­dis­tân­cias. É pre­ciso res­peitar o Di­reito In­ter­na­ci­onal e os di­reitos do povo pa­les­ti­niano! Exige-se do Go­verno por­tu­guês uma po­sição clara e inequí­voca de con­de­nação de Is­rael e de apoio aos di­reitos na­ci­o­nais do povo pa­les­ti­niano!




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