Generalizar o teletrabalho não é solução para o País
DENUNCIAR Vários trabalhadores deixaram o seu depoimento na sessão pública «Salários, horários e família em teletrabalho», realizada pelo PCP, no dia 27, em Lisboa. Jerónimo de Sousa também interveio.
«Estou a ser pior pai em teletrabalho»
«O teletrabalho é um instrumento que, tendo sido utilizado no actual contexto por força das circunstâncias de saúde pública, há quem queira alargar, endeusar e promover como um remédio para todos os males», começou por afirmar Ana Sofia Correia, membro da Direcção da Organização Regional de Lisboa, que apresentou a sessão.
Mostrar a realidade concreta dos trabalhadores que se têm defrontado com as práticas «menos coloridas» do teletrabalho, foi o principal objectivo desta sessão.
«É certo que uma parte significativa nunca deixou de estar presencialmente no local de trabalho. Mas a imposição do teletrabalho afectou muitos milhares de trabalhadores, praticamente de todos os sectores», começou por afirmar Jerónimo de Sousa, que interveio no final da iniciativa.
Para o PCP não está em causa o aproveitamento das novas tecnologias ao serviço do desenvolvimento e da melhoria das condições de trabalho e de vida. O que está em causa é o «aproveitamento pelo grande capital, para aumentar a exploração», afirmou o Secretário-geral do PCP.
Os mesmos de sempre são os que querem o «agravamento da exploração com intensificação do trabalho, na duração e no ritmo»; os que querem a «redução de custos das empresas com a transferência para o trabalhador de custos de instalações, água, electricidade, internet», ou os que querem «fazer o caminho para acabar com componentes da remuneração dos trabalhadores, no imediato ou a prazo, nomeadamente o subsídio de refeição e de transportes».
Para enfrentar esta situação insustentável, o PCP propôs, e a Assembleia da República aprovou, a medida que permite aos trabalhadores dos serviços essenciais recorrerem às escolas de acolhimento, independentemente de terem o cônjuge em teletrabalho. Foram alargadas as respostas de apoio asseguradas pela Acção Social Escolar, como o aumento do acesso às cantinas escolares.
Todavia, com os votos de PS, PSD e CDS, foram chumbadas as restantes propostas do Partido, as quais resolveriam muitos outros problemas, caso do pagamento a 100 por cento a quem está em assistência a filhos e a aplicação deste regime a quem tem filhos até aos 16 anos, enquanto as escolas se mantiverem encerradas.
Realidade e problemas concretos
Para Raul Ramires, trabalhador numa companhia de seguros, a principal dificuldade é viver e trabalhar numa casa, cujas dimensões – à semelhança das casas de uma grande parte dos portugueses – são bastantes pequenas.
Anabela Laranjeira, professora de português para estrangeiros, já dava aulas em casa antes da pandemia, mas agora com o filho de seis anos consigo, não consegue manter a privacidade da sua família, uma das suas preocupações.
Já Hugo Dionísio, advogado do gabinete jurídico da CGTP-IN, desenhou um cenário geral da situação dos muitos trabalhadores que têm recorrido ao auxílio da central sindical. Para ele, o teletrabalho apenas veio agravar a desigualdade entre os trabalhadores.
Marta Corato, trabalhadora bancária, afirmou que apesar de algumas vantagens, os prejuízos do teletrabalho são muitos mais. Carmen Nunes, dirigente do Sinapsa, alertou para a utilização de contratos de teletrabalho como um novo instrumento de precarização.
O trabalhador da Altice, Daniel Negrão, afirmou que é «impossível trabalhar com filhos em casa», mas que graças à intervenção do PCP, vai poder ficar dedicado ao seu filho sem perda de salário, embora perca o subsídio de alimentação.
Ana Oliveira, trabalhadora da NOS, e Pedro Braga, programador, referiram o aumento das suas despesas domésticas como um grande problema, enquanto que Anabela Silva, dirigente do SIESI, referiu algumas das conquistas dos trabalhadores dos Call Centers da EDP, como a garantia do pagamento da internet.
Já, Eduardo Veríssimo, também dirigente sindical, alertou para a invasão do ambiente doméstico pelo patronato.