Desindustrialização e dependência, agora pintadas de verde

Vasco Cardoso

Desde a integração de Portugal na CEE/UE que o aparelho produtivo nacional anda a ser demolido, agravando todos os défices. Nos comboios, no vidro plano, no aço, na indústria naval, encerraram-se unidades produtivas e o País passou a depender de importações. Sempre em nome de um qualquer «pelotão da frente».

Agora, o «pelotão da frente», instrumentalizando justas preocupações ambientais, é o da descarbonização. No espaço de um mês anunciou-se o encerramento de uma refinaria em Matosinhos e de uma central térmica em Sines, decisões das privatizadas GALP e EDP, que contaram com a conivência do Governo, o apoio da UE e a garantia de milhões de euros de recursos públicos para concretizar tais decisões. Com isto, esconde-se que as emissões que agora são feitas na refinaria de Matosinhos passarão a ser feitas a partir de outras refinarias, designadamente na Corunha, ou que as emissões da central de Sines, serão substituídas por emissões de centrais, a carvão ou nucleares, situadas em Espanha ou em França. Pelo caminho, ficará um rasto de desemprego, o desaproveitamento de mão-de-obra qualificada, os custos transferidos para a segurança social, a dependência externa, o aumento do preço na energia.

Sublinhe-se que, no caso concreto da refinaria, esta não se destina apenas a refinar combustível mas alimenta outras indústrias de base nacional. É onde se produzem os benzenos, as parafinas, o xileno e o tolueno de alguns medicamentos. Onde se produzem asfaltos e betumes. E os solventes usados nos óleos alimentares ou nas tintas. As ceras minerais usadas em colas e velas. Os óleos base usados na produção de borracha e vedantes. Coisa pouca dirão alguns, grande vitória dirão outros, sobretudo os que propagam a ilusão de que o fim da indústria nacional é uma bênção ambiental.

O caminho não é o da desindustrialização para beneficiar as grandes potências da UE e as transnacionais, mas o da recuperação do controlo público e democrático dos sectores estratégicos, permitindo o investimento em tecnologias mais limpas e a articulação entre os valores ambientais e a defesa dos interesses nacionais.




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