Silêncios que gritam
Como já aqui assinalámos, o tratamento mediático da campanha para as eleições presidenciais pauta-se por um silenciamento cirúrgico: ignora-se quem está no terreno, enquanto se dá visibilidade a outros, seja a propósito do cargo que ocupam, dos elogios cruzados entre alguns dos candidatos, ou através da sua presença em espaços de entretenimento.
Assistimos, ao longo das últimas semanas, a notícias sobre o confinamento de Ana Gomes, à entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa na RTP (uma hora, em horário nobre e em sinal aberto para dizer o que quis – oportunidade que, arriscamos, nenhum outro candidato terá), vimos Marisa Matias no Programa da Júlia, e em tudo isto os elogios de Marcelo a Marisa, de Marisa a Ana Gomes, de Ana Gomes a Marcelo.
Só nos últimos dias, João Ferreira esteve em Coimbra, com gente da Cultura; esteve em Braga, em contacto com o comércio local, que atravessa um momento difícil, e com os trabalhadores da Continental Mabor, ainda em Abril vítimas do lay-off; esteve num comício na Maia; viajou de comboio na linha do Oeste; para lá de ter realizado encontros e visitas em sectores como o da saúde, da justiça, do poder local, do movimento associativo ou da agricultura. Nada disto teve qualquer visibilidade mediática: nenhum órgão de comunicação social cobriu qualquer das iniciativas da candidatura. Aliás, na única iniciativa do último mês com presença da comunicação social – o comício em Alhos Vedros – ignoraram por completo não só a intervenção mas até a presença do candidato. Tanto a RTP como a Lusa só trataram a intervenção do Secretário-geral do PCP; se a segunda ainda referia que o comício era da candidatura, através das imagens da RTP só mesmo pelo pano de fundo se poderia inferir esse facto.
Os escassos momentos em que, efectivamente, a candidatura tem tido espaço mediático tem sido em entrevistas. Mas até aqui se tem notado o esforço em desviar a conversa do que de facto está em causa – a eleição do Presidente da República e o que a candidatura traz de único e singular a esta batalha.
Apesar de as mesmas questões já terem sido respondidas múltiplas vezes, quem conduz as entrevistas não tem sido capaz de fugir a um guião pré-estabelecido, visando acantonar e menorizar a candidatura: se, depois de ser candidato a outras coisas, esta candidatura não significa falta de quadros no PCP; se na verdade esta candidatura é um prólogo à candidatura a outras coisas; a que se somam outros elementos que nem questões chegam a ser, como o já clássico enumerar dos últimos resultados eleitorais para induzir à conclusão de que estamos perante mais uma «derrota anunciada» de um Partido «envelhecido» e em «definhamento».
Outra das questões recorrentes insiste na ideia da desistência a favor de outros, mas, como tem sido respondido, esta é uma candidatura insubstituível pelos valores que comporta. Por muito que inclinem o campo, não desistimos desta como doutras batalhas.