Portugal não está condenado a ser um território desigual
CENTENÁRIO «A intervenção do PCP pela coesão do território e o desenvolvimento harmonioso do País» foi o tema do debate realizado no sábado, 17, em Mirandela.
Os desequilíbrios acumulados não se resolvem com operações de fachada
A iniciativa, realizada no âmbito das comemorações do Centenário do Partido, foi justamente acolhida no distrito de Bragança por este ser um exemplo flagrante das consequências da política de direita no agravamento das assimetrias regionais, e, bem assim, particularmente carente da política alternativa que o PCP propõe para as travar e inverter.
Ao final da tarde, no auditório do Instituto Piaget em Mirandela, cerca de 25 pessoas participaram num debate em que para além do diagnóstico da situação e dos seus responsáveis, foram avançadas propostas e soluções. Desde logo por Patrícia Machado, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP, que frisando que os desequilíbrios acumulados não se resolvem com operações de fachada consubstanciadas em reuniões ou transferência de ministérios e secretarias de Estado para o Interior, rejeitou, por outro lado, a ideia de que a desertificação e a divergência económico-social seja uma fatalidade, uma realidade imutável, impossível de alterar.
Os problemas de territórios como Trás-os-Montes não são os próprios territórios, e muito menos quem lá insiste em viver e trabalhar ou, até, pretende fazê-lo. São as políticas contrárias ao seu progresso que têm sido aplicadas – de liquidação de serviços públicos e funções sociais do Estado; de desaproveitamento de potencialidades e recursos endógenos que persistem e de retracção no investimento público para as fazer florescer; de privatização de sectores estratégicos, de mercantilização da natureza e de promoção de monoculturas tantas vezes sem sustentação ambiental; de condicionamento do direito à mobilidade e de negação do preceito constitucional da criação das regiões administrativas.
Por isso, Patrícia Machado defendeu elementos centrais da política alternativa, patriótica e de esquerda, que os comunistas propõem, entre os quais avultam a valorização e aposta na produção nacional e no emprego com direitos ou o reforço do papel e intervenção do Estado em vários domínios.
João Almeida, por seu lado, sublinhando que a criação das regiões administrativas, pelas quais o PCP sempre se bateu e continuará a bater, não é, por si só, a panaceia capaz de resolver todos os problemas, considerou que sem elas não é possível travar e inverter o actual quadro de declínio.
As regiões administrativas são, assim, um instrumento passível de contribuir na correcção de desequilíbrios e na exigência de políticas sérias de investimento e descentralização. Isto além de representarem um espaço de participação das populações, bem diferente do actual quadro tutelar que as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional têm sobre as Comunidades Intermunicipais (CIM), pugnou.
De resto, três outros intervenientes no debate referiram-se a este aspecto sob diferentes ângulos. O produtor agrícola Rui Tadeu, abordando a questão do despovoamento, defendeu que a aproximação do poder político das pessoas pode ajudar a combatê-lo, e o empresário Bruno Rodrigues denunciou que nas cidades, vilas e aldeias mais pequenas, a luta reivindicativa e a participação populares estão tanto mais sobre-condicionadas e controladas quanto maior é a concentração do poder político.
Fátima Bento, membro da Direcção da Organização Regional de Bragança (ORB) do PCP, pegou no exemplo da atribuição às CIM da gestão do Programa de Apoio à Redução Tarifária para evidenciar como os eleitos nas assembleias municipais estão impedidos de fiscalizar de forma directa a sua aplicação. Como consequência, muitas das populações da região encontram-se privadas de apoios públicos aos títulos de transporte e muitas encontram-se mesmo sem um meio de transporte essencial para as suas deslocações.
Responsáveis
Intervindo no debate, Filipe Costa, membro do Comité Central do PCP e responsável pela ORB, criticou os que insistem em medidas avulsas, que detalhou, e vertem lágrimas de crocodilo para com o défice demográfico, deixando muito claro que este é o resultado de uma política que, entre 2009 e 2015, nos 12 concelhos do distrito de Bragança, encerrou quase 70 estabelecimentos de ensino, do pré-escolar ao Superior.
«O grave défice demográfico», insistiu o dirigente comunista, «é o resultado de uma política que reduziu o poder de compra às populações», de «acelerada sangria de recursos humanos, destruição de condições materiais e organizacionais e encerramento e desclassificação de hospitais públicos, de políticas agro-florestais inspiradas na Política Agrícola Comum da União Europeia.
Sobre as políticas agro-florestais, aliás, outro interveniente na sessão, Rui Baião, criticou a legislação produzida avulsa, desordenada, labiríntica, e o clima de coação sobre os proprietários; rejeitou que a pequena propriedade seja hoje um obstáculo à gestão e ordenamento do território; acusou o Governo de não compreender a complementaridade de rendimentos entre a actividades agrícola, pecuária e silvícola para milhares de famílias do interio, e sustentou que «o desenvolvimento do interior, do mundo rural, da agricultura e das florestas estão interligados e a aposta na sua evolução é inseparável da rentabilidade dos territórios e da melhoria significativa das vidas dos que neles vivem».
Existem soluções
Ora, Filipe Costa, além de reiterar a defesa da criação das regiões administrativas, lembrou a necessidade de um plano estratégico de desenvolvimento regional no quadro da política alternativa que o PCP propõe, do qual fazem parte propostas específicas como a promoção do Complexo do Cachão como uma unidade industrial pública, pensada no aproveitamento integral do potencial agrícola da região e na valorização da produção nacional; a reactivação e modernização das linhas do Tua, Sabor, Douro e Corgo e a ligação ferroviária a Espanha para transporte de passageiros e mercadorias; a compensação da região por parte das empresas de produção de energia e a implementação de apoios à agricultura familiar em toda a fileira produtiva.
Importa, ainda, reabilitar a indústria extractiva em Torre de Moncorvo, definir um plano regional de melhoria e ampliação da rede viária, elaborar um plano integrado e sustentado do regadio, pensar um programa de desenvolvimento do turismo que promova, valorize e defenda as características naturais e paisagísticas da região e a sua diversidade cultural, e adoptar medidas de valorização e diferenciação dos produtos endógenos e das raças autóctones, por via da sua garantia de qualidade e características únicas, elencou Filipe Costa.