Por onde se sai?

Vasco Cardoso

Os as­tros ali­nham-se para uma certa «uni­dade» na­ci­onal sobre a quem será pas­sada a fac­tura das con­sequên­cias, e do apro­vei­ta­mento, do surto epi­dé­mico. Na TV, na­tu­ra­liza-se o de­sem­prego, os des­pe­di­mentos, o layoff, os cortes nos sa­lá­rios. Há jor­nais, como o Cor­reio da Manhã, que sus­citam a in­dig­nação na sua pri­meira pá­gina: «Função Pú­blica mantém re­ga­lias!». Nos des­por­tivos ce­le­bram-se os jo­ga­dores que chegam a acordo para a re­duzir sa­lá­rios. Afinal, calha a todos! A ca­ri­dade co­meça a ter no­va­mente no­va­mente honras de ho­rário nobre, onde apa­recem caras co­nhe­cidas que nos falam dos «po­bres». As pro­jec­ções sobre os im­pactos so­ciais já se fazem para largos anos, pelo menos dez, dizem. Vem aí a «aus­te­ri­dade», si­nó­nimo de ex­plo­ração e em­po­bre­ci­mento nos anos dos PEC e do Pacto de Agressão, tempos das «vacas ma­gras» como su­geriu agora o pri­meiro-mi­nistro.

A na­tural pre­o­cu­pação face aos riscos para a saúde do surto epi­dé­mico, mas também o medo e o alar­mismo di­fun­didos, fa­ci­litam a acei­tação das me­didas e do rumo. Tudo é re­la­tivo face à im­por­tância pri­meira de salvar vidas hu­manas! E é isso que, no es­sen­cial do­mina ainda as pre­o­cu­pa­ções. Na ver­dade vai sendo feito um ca­minho de pre­pa­ração co­lec­tiva para as «ine­vi­ta­bi­li­dades».

Não su­bes­ti­mamos o tre­mendo im­pacto eco­nó­mico e so­cial de uma si­tu­ação cujo o termo ainda não é co­nhe­cido. So­bre­tudo num País como o nosso, com o seu grau de pen­dência, com a sua frágil es­tru­tura pro­du­tiva, com se­veras imi­ta­ções de so­be­rania, como a mo­ne­tária. Mas na res­posta a pro­blemas desta di­mensão co­locar-se-á sempre a questão: que in­te­resses de­fender? Os dos tra­ba­lha­dores e do Povo, ou os dos mo­no­pó­lios?

Os úl­timos tempos tor­naram mais evi­dente (ainda que de forma muito li­mi­tada) a im­por­tância da va­lo­ri­zação dos sa­lá­rios, de ter di­reitos, do mer­cado in­terno de que de­pendem as nossas MPME. E o vírus também pôs a nu a ne­ces­si­dade de ter ser­viços pú­blicos ca­pazes, a co­meçar pelo SNS. De não de­pender do es­tran­geiro para ter ali­mentos ou me­di­ca­mentos. De ter uma banca que apoie o País em vez de o afundar. De ter so­be­rania!

A luta por uma po­lí­tica al­ter­na­tiva, por uma saída da si­tu­ação que de­fenda o Povo, não está, nem pode estar de qua­ren­tena!



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